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FASB abre inscrições para o 3º Study Tour Brasil 

O evento terá programação de seis dias visitando iniciativas de restauração florestal e uso sustentável do solo, entre Vitória e Porto Seguro, em uma das regiões mais relevantes da Mata Atlântica 

Nos dias 13 a 18 de maio o FASB realizará o 3º Study Tour, com uma programação que inclui visitas a iniciativas e projetos socioambientais, em comunidades tradicionais e propriedades privadas entre as cidades de Vitória/ES e Porto Seguro/BA, em uma região chamada de Hileia Baiana, que compõe uma das áreas com o maior número de fragmentos florestas significativas para a conservação da Mata Atlântica. As inscrições estão abertas para profissionais, instituições, lideranças e empresas que atuam e desenvolvem projetos socioambientais e têm foco na restauração de paisagens no site do FASB.

Em sua terceira edição, o evento preparou uma jornada que irá explorar como promover ações integradas para o fortalecimento da cadeia da restauração florestal na Hileia Baiana. Serão seis dias de atividades para conhecer as diferentes intervenções que estão programadas e sendo realizadas no território, além de apresentar os desafios a serem enfrentados e as oportunidades de melhorias.

Para Márcio Braga, coordenador geral do FASB, “este será um momento para refletir sobre o desenvolvimento de projetos que reestruturem a cobertura vegetal de um dos ecossistemas mais importantes do país, com destaque na aplicação de novas tecnologias, investimento de recursos financeiros, parcerias institucionais, geração de renda e eficiência.”

O evento conta com apoio do WWF-Brasil, que atua coletivamente na conservação ambiental da região da Hileia Baiana, e do Diálogo Florestal por meio do Fórum Florestal da Bahia, que é um espaço permanente de diálogo da sociedade sobre as florestas no sul e extremo sul da Bahia.

“A expansão do FASB para o Espírito Santo é uma oportunidade de fortalecer a cadeia da restauração na região e de apoiar as organizações na implementação de projetos desenvolvidos localmente”, afirma Daniel Venturi, especialista de Conservação e líder da estratégia de Mata Atlântica do WWF-Brasil.  De acordo com a Secretária Executiva do Fórum Florestal da Bahia, Erica Munaro, “o Study Tour será uma oportunidade de nos aproximar das diferentes realidades de comunidades e instituições que estão atuando na construção de soluções para uso e conservação de paisagens sustentáveis. Dessa forma, poderemos refletir sobre os desafios e oportunidades visando a conectividade da rica biodiversidade existente no Corredor Central da Mata Atlântica”.

O Study Tour dar-lhe-á a oportunidade de aprofundar questões de como reforçar a governança para que os diferentes atores possam ser integrados na tomada de decisões a nível territorial, como garantir o apoio financeiro para o fortalecimento da cadeia da restauração florestal e promover um impacto significativo na paisagem, como a construção de um corredor ecológico de 500 km.

Além da programação, o evento será o marco para o lançamento do segundo ciclo de investimentos do FASB em projetos socioambientais de origem do sul da Bahia e expandindo para o norte do Espírito Santo, divulgando o período e o processo de inscrição de novos projetos.

Nessa jornada, o participante terá uma experiência de aprendizagem, em que poderá explorar em conjunto as ações de restauração florestal mais adequadas para a construção de um corredor ecológico na Hileia Baiana e o que é necessário para colocá-las em prática.

Serviço:

Sobre o FASB

O FASB é um programa de incubação e aceleração que segue um ciclo de projeto em várias etapas, fornecendo assistência técnica desde a origem até sua implementação completa, apoiando a evolução do projeto desde os estágios iniciais até sua conclusão. O trabalho é feito com base em uma abordagem inovadora, posicionando as partes interessadas no centro do desenvolvimento dos projetos, obtendo uma grande diversidade de instituições envolvidas. Estão previstos investimentos entre 20 e 40 milhões de reais destinados a projetos para restauração da Mata Atlântica no norte do ES e no sul da Bahia.

Sobre o WWF-Brasil

O WWF-Brasil é uma ONG brasileira que há 27 anos atua coletivamente com parceiros da sociedade civil, academia, governos e empresas em todo país para combater a degradação socioambiental e defender a vida das pessoas e da natureza. Estamos conectados numa rede global interdependente que busca soluções urgentes para a emergência climática. Conheça: www.wwf.org.br

Sobre o Diálogo Florestal/FFBA

O Fórum Florestal da Bahia é um canal dialógico que tem como objetivo identificar agendas comuns entre empresas do setor florestal, organizações não governamentais, organizações sociais, instituições de pesquisas e órgãos governamentais de regulamentação e preservação para a promoção de ações efetivas, visando a conservação e restauração do meio ambiente e a geração de benefícios tangíveis, tanto para os participantes do diálogo quanto para a sociedade em geral. O Diálogo Florestal é uma iniciativa pioneira e independente que desde 2005 facilita a interação entre representantes de empresas, associações setoriais, organizações da sociedade civil, grupos comunitários, povos indígenas, associações de classe e instituições de ensino, pesquisa e extensão. Conta com 245 membros em sete Fóruns Florestais regionais e um conselho de coordenação nacional formado por representantes de empresas do setor florestal, organizações da sociedade civil e instituições de ensino e pesquisa.

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Estudo revela viabilidade econômica da restauração florestal em fazendas de café na Mata Atlântica

Resultados indicam que serviços ecossistêmicos impulsionados pelo reflorestamento, entre eles a polinização, proporcionam maior produtividade e compensam os custos associados à restauração

A restauração florestal é reconhecida como uma das medidas mais eficazes para combater as mudanças climáticas e promover a proteção à biodiversidade. No entanto, os custos elevados – associados tanto diretamente ao plantio de árvores quanto à perda de áreas agriculturáveis ou de pastagem – costumam ser uma barreira para a sua implementação em larga escala. Mas uma pesquisa inédita conduzida em áreas de cafeicultura da Mata Atlântica revela que a restauração pode, ao contrário, ser uma abordagem economicamente viável.

Publicado na revista científica norte-americana One Earth, o estudo é assinado por Francisco d’Albertas, doutor em Ecologia pela USP, Gerd Sparovek, coordenador do Geolab (Esalq-USP), Luís Fernando Guedes Pinto, engenheiro agrônomo e diretor-executivo da Fundação SOS Mata Atlântica, Camila Hohlenwerger, doutora em Ecologia pela USP, e Jean-Paul Metzger, professor do departamento de Ecologia da USP.

Os resultados demonstram que o aumento dos serviços ecossistêmicos impulsionados pelo reflorestamento, entre eles a polinização, resulta em um incremento na produção de café, compensando os custos referentes à restauração da floresta. Essa descoberta pode auxiliar os formuladores de políticas públicas a promover a adoção generalizada da restauração em paisagens agrícolas, aliando a mitigação das mudanças climáticas, a conservação da biodiversidade e a produção agrícola. Além disso, no caso do Brasil, em que a legislação ambiental já prevê a restauração/conservação de vegetação nativa em propriedades rurais, o estudo pode servir como um estímulo adicional para o cumprimento da lei.

O levantamento analisa diferentes cenários, estabelecendo um limiar em torno de 25% de cobertura florestal nas fazendas como ponto de equilíbrio para que, ao longo de 20 anos, os custos de restauração possam ser compensados pelos benefícios dos serviços ecossistêmicos no aumento da produção de café. Os resultados apontam ainda que um valor de CO₂ de pelo menos 20 dólares seria o ideal para aumentar a viabilidade financeira da restauração.

“Nossa pesquisa mostra que, ao impulsionar os rendimentos das colheitas e combinando ganhos provenientes do sequestro de carbono, a restauração se torna uma abordagem economicamente eficaz em paisagens agrícolas, indo na contramão do senso comum que considera o agronegócio e a conservação ambiental como atividades incompatíveis”, explica Francisco d’Albertas. “São, entretanto, necessárias medidas adicionais, como a consolidação do mercado de carbono, para tornar a restauração amplamente viável e imediatamente atraente para os agricultores”, completa.

A Organização das Nações Unidas (ONU) designou o período de 2021 a 2030 como a Década da Restauração de Ecossistemas. Na Conferência de Biodiversidade da ONU de 2022, a COP 15, a Mata Atlântica foi reconhecida como um dos dez ecossistemas emblemáticos nessa iniciativa. Além disso, evidências indicam o bioma como uma das áreas prioritárias para a restauração global, dada sua capacidade de combater as mudanças climáticas e preservar a biodiversidade e os recursos hídricos.

Nesse sentido, Luís Fernando Guedes Pinto ressalta a importância das descobertas apresentadas pela pesquisa. “Para atender aos compromissos do Acordo de Paris, o Brasil deve eliminar completamente o desmatamento e restaurar em grande escala. Para a Mata Atlântica, a meta mais ambiciosa são 15 milhões de hectares de florestas naturais até 2030, estabelecida pelo Pacto pela Restauração do Bioma, que só poderá ser atingida com o apoio do agronegócio. E agora está evidente que o reflorestamento é uma abordagem positiva para todas as pessoas e setores econômicos”, afirma.

A pesquisa traz um estudo de caso ilustrativo que, para ampliar o entendimento sobre em que medida e em quais condições os benefícios da restauração compensam os custos, pode ser expandido para outras regiões do Brasil e do mundo. O estudo completo, intitulado Yield increases mediated by pollination and carbon payments can offset restoration costs in coffee landscapes (“Aumentos na produção, mediados pela polinização e pagamentos de carbono, podem compensar os custos de restauração em paisagens de café”, em tradução livre), está disponível, em inglês, no site da OneEarth.

Sobre a Fundação SOS Mata Atlântica 

A Fundação SOS Mata Atlântica é uma organização da sociedade civil brasileira sem fins lucrativos. Fundada em 1986, tem como missão inspirar a sociedade na defesa do bioma mais devastado do país. Atua para promover políticas públicas para conservar e restaurar a Mata Atlântica, trabalhando de maneira integrada as temáticas de água, biodiversidade e clima. Monitora a situação das florestas e ecossistemas associados, além de trabalhar para recuperar áreas já degradadas. Também defende e cria políticas públicas em prol do bioma. Essa causa beneficia diretamente mais de 70% da população brasileira, que vive na Mata Atlântica e depende dela para ter qualidade de vida.

Informações: Revista Cafeicultura.

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82% das espécies de árvores que só ocorrem na Mata Atlântica estão ameaçadas de extinção

Estudo liderado por pesquisadores da USP e publicado na Science avaliou categorias de risco de todas as espécies arbóreas da Mata Atlântica; 13 espécies exclusivas daquele bioma podem já ter sido extintas

A extinção de espécies é um dos impactos mais extremos que o ser humano tem sobre a natureza. Extinção é para sempre e, a cada espécie perdida, perdemos milhões de anos de uma história evolutiva única e a oportunidade de aprender com essa história. Assim, evitar a extinção de espécies é o maior desafio para combater a atual crise global de perda da biodiversidade, que tem impacto direto nas nossas vidas, incluindo questões ligadas ao risco de pandemias, bioeconomia, biomateriais, desenvolvimento de medicamentos e vários outros serviços ecossistêmicos. O primeiro passo para frear esse processo de extinção de espécies é saber onde estão e qual é o grau de ameaça de cada espécie, o que permite a construção das chamadas Listas Vermelhas de Espécies. Estas listas nos ajudam a tomar a decisão de quais são as espécies prioritárias para investir tempo e recursos de conservação da biodiversidade.

Um estudo publicado recentemente na revista Science apresentou a Lista Vermelha das quase 5.000 espécies de árvores que ocorrem na Mata Atlântica, uma das florestas mais biodiversas e ameaçadas do mundo. “O quadro geral é muito preocupante”, diz Renato Lima, professor da USP que liderou o estudo. “A maioria das espécies de árvores da Mata Atlântica foi classificada em alguma das categorias de ameaça da União Internacional de Conservação da Natureza (IUCN). Isso era esperado, pois a Mata Atlântica perdeu a maioria das suas florestas e, com elas, as suas árvores. Mesmo assim, ficamos assustados quando vimos que 82% das mais de 2.000 espécies exclusivas desse hotspot global de biodiversidade estão ameaçadas”, completa Lima.

Muitas espécies emblemáticas da Mata Atlântica, como o pau-brasil, araucária, palmito-juçara, jequitibá-rosa, jacarandá-da-bahia, braúna, cabreúva, canela-sassafrás, imbuia, angico e peroba, foram classificadas como espécies ameaçadas de extinção. Um total de 13 espécies endêmicas – espécies que ocorrem apenas na Mata Atlântica e em nenhum outro lugar do mundo – foram classificadas como possivelmente extintas, ou seja, podem ter desaparecido do planeta. Por outro lado, cinco espécies que antes eram consideradas extintas na natureza foram redescobertas pelo estudo. O trabalho usou mais de 3 milhões de registros de herbários e de inventários florestais, além de informações detalhadas sobre a biologia, ecologia e usos das espécies de árvores, palmeiras e samambaiaçús.

A construção da lista de espécies ameaçadas da Mata Atlântica se baseou em diferentes critérios da IUCN. “E esse foi um outro aspecto importante do trabalho”, acrescenta Lima. “Se tivéssemos usado menos critérios da IUCN nas avaliações de risco de extinção das espécies, o que geralmente tem sido feito até então, nós teríamos detectado seis vezes menos espécies ameaçadas. Em especial, o uso de critérios que incorporam os impactos do desmatamento aumenta drasticamente o nosso entendimento sobre o grau de ameaça das espécies da Mata Atlântica, que é bem maior do que pensávamos anteriormente”, finaliza Lima.

Resultados do estudo para a proporção de espécies de árvores endêmicas da Mata Atlântica classificadas em cada categoria de ameaça da IUCN: LC= Menos preocupante (verde); NT= Quase ameaçada (verde-claro); VU= Vulnerável (amarelo); EN= Em perigo (laranja); CR= Criticamente em Perigo (vermelho). Créditos: R.A.F. Lima.

A maior parte das informações necessárias para avaliações usando muitos critérios da IUCN é difícil de obter ou estimar a partir de outras fontes de dados. Consequentemente, a maioria das avaliações de risco de extinção atualmente disponíveis na IUCN se baseia apenas na distribuição geográfica das espécies, o chamado critério B. Mas o declínio no número de árvores adultas causado pelo desmatamento (investigado pelo critério A) é a principal causa de ameaça das espécies, principalmente em hotspots globais de biodiversidade altamente alterados como a Mata Atlântica. Ou seja, utilizar vários critérios da IUCN para a construção de listas vermelhas pode evitar uma grave subestimação do grau de ameaça das espécies. Para estimar o declínio das populações, dados de inventários florestais ao longo de toda a Mata Atlântica foram reunidos em uma única base de dados (TreeCo), permitindo entender como o número de árvores foi reduzido pelo desmatamento ao longo do tempo.

Hans ter Steege (Naturalis Biodiversity Center, Holanda), coautor do trabalho, relembra que o estudo não se limitou à avaliação da ameaça de extinção apenas na Mata Atlântica. “Fizemos projeções sobre qual seria a magnitude do impacto da perda de florestas sobre as espécies de árvores em escala global.” Essas projeções incluíram os principais maciços de florestas tropicais do mundo. “As projeções indicam que entre 35-50% das espécies de árvores do planeta podem estar ameaçadas apenas devido ao desmatamento”, conclui Ter Steege. Além destas projeções, o estudo propõe um fluxo metodológico  e ferramentas para implementá-lo em larga escala, permitindo avaliar o grau de ameaça de milhares de espécies simultaneamente. “Isso também permite aplicar a mesma abordagem para outras regiões do mundo ou até outras formas de vida, como orquídeas ou bromélias, por exemplo”, lembra Gilles Dauby (IRD, França), também coautor do estudo.

Espécies emblemáticas da Mata Atlântica, como o pau-brrasil, araucária, palmito-juçara, jequitibá-rosa, jacarandá-da-bahia, braúna, cabreúva, canela-sassafrás, imbuia, angico e peroba foram classificadas como ameaçadas de extinção. Na imagem, a araucária – Foto: Hans Ter Steege.

Segundo Marinez Siqueira e Eduardo Fernandez, do Centro Nacional de Conservação da Flora, órgão do Instituto de Pesquisas Jardim Botânico do Rio de Janeiro responsável pela elaboração da Lista Vermelha Oficial da Flora do Brasil, a abordagem usada no estudo é robusta para avaliar o grau de ameaça das espécies, e será utilizada de forma sistematizada a partir de 2024 para avaliar as cerca de 12.000 espécies de plantas que ocorrem apenas no Brasil e que ainda não tiveram o seu grau de ameaça avaliado oficialmente. “Isso será um ganho em escala sem precedentes para avaliar a megadiversa flora do Brasil, em um período de tempo muito mais compatível com as necessidades urgentes de políticas públicas e planos de ação para protegê-las”, avaliam Marinez e Eduardo.

A abordagem inovadora proposta pelo estudo se propõe a avançar com a utilização de dados populacionais das espécies de árvores da Mata Atlântica, que muitas vezes acabaram sendo negligenciados durante o processo de avaliação de risco de extinção por não estarem prontamente disponíveis em repositórios digitais ou por se encontrarem pulverizados em diferentes  banco de dados. “Por fim, entender onde se situam as espécies ameaçadas e quais vetores estão promovendo a ampliação de seus riscos de extinção nos permitirá agir no sentido de reverter esse cenário”, finalizam. 

O cenário é muito preocupante, principalmente porque o estudo considerou apenas ameaças passadas (desmatamento) e não as ameaças futuras, como as mudanças climáticas, que podem acelerar os riscos de extinção de espécies. O que podemos fazer frente a esse cenário? Além da conservação das espécies em jardins botânicos e bancos de germoplasma, existem os chamados Planos de Ação Nacionais (PANs), instrumentos de promoção de políticas públicas direcionadas à conservação e à recuperação de espécies ameaçadas no Brasil, em especial àquelas em risco iminente de desaparecer.

Outra saída para buscar reverter as perdas de espécies de árvores na Mata Atlântica é a restauração florestal, como comenta André de Gasper, professor da FURB e coautor do estudo. “Projetos de restauração, em áreas abertas ou em fragmentos degradados, podem selecionar preferencialmente as espécies regionais mais ameaçadas da Mata Atlântica, visando estimular a produção de sementes e mudas destas espécies e a recuperação das suas populações de árvores na natureza.” Estamos em plena Década das Nações Unidas da Restauração de Ecossistemas, o que favorece iniciativas regionais e a criação de políticas públicas capazes de usar a restauração para reverter esse triste cenário enfrentado pelas árvores da Mata Atlântica e dos demais hotspots globais de biodiversidade.

Link para o trabalho: https://doi.org/10.1126/science.abq5099

Informações: Jornal USP.

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Novo negócio da Votorantim mistura floresta e agro e fatura no Cerrado e no Pantanal

CEO da Reservas Votorantim, David Canassa fala das parcerias recentes com o agronegócio e diz já estar gerando receitas com arrendamento de terras conservadas e a venda de créditos de carbono em dois biomas

O faturamento de R$ 53 bilhões do grupo Votorantim envolve diversos produtos como cimento, alumínio, energia renovável e até suco de laranja, mas a mais nova fonte de receita é “a árvore em pé”, por meio de uma de suas empresas investidas – a Reservas Votorantim. Em entrevista ao AgFeed o diretor executivo da Reservas Votorantim, David Canassa, fala entusiasmado das oportunidades de negócio que vem sendo geradas pela empresa.

Um dos principais pilares da companhia é a gestão de territórios conservados, aqueles que tem vegetação nativa preservada, mesmo que em conjunto com atividades agropecuárias. Além de cumprir a legislação e ajudar produtores e empresas a atingir metas de sustentabilidade, a missão é criar oportunidades de negócio, o que está ocorrendo, na prática.

“Fomos os primeiros a produzir crédito de carbono no Cerrado brasileiro, o que abriu uma vertente muito importante. É uma receita que antes não existia”, conta o executivo. Ele se refere ao chamado “Legado Verdes do Cerrado”, uma área de 32 mil hectares, em Niquelândia, no Norte de Goiás, administrada pela Reservas Votorantim.

Deste total, uma porção de 10,5 mil hectares foi certificada, internacionalmente, para gerar 50 mil créditos de carbono por ano. A primeira comercialização foi feita em 2023 por US$ 15 por tonelada, quando a empresa embolsou cerca de R$ 3,8 milhões.

A certificação foi atingida à medida que a empresa se comprometeu a preservar uma área que, por lei, estava apta a ser desmatada. Mas esse foi o primeiro passo e a expectativa é seguir avançando, inclusive em outros biomas, não apenas gerando créditos para a própria empresa, mas também atuando como uma espécie de consultoria para outros interessados.

“É um projeto muito importante de possibilidades para proprietários rurais que queiram pensar em outras oportunidades que não apenas o agronegócio em si”, explica Canassa.

O executivo diz que a empresa já está auxiliando produtores que queiram ter projetos
semelhantes, mas todos estão em andamento, levando até dois anos para ficar pronto. “Quando fizemos no Cerrado, era o primeiro fora do bioma amazônico, por isso fomos extremamente conservadores. Agora, vamos avançar, talvez incluir também áreas de APPs e reserva legal”, disse.

Projeto no Pantanal

David Canassa revelou ao AgFeed que a Reservas Votorantim está finalizando um novo projeto de créditos de carbono, desta vez no Pantanal. Será uma área da famosa Fazenda Bodoquena, em Mato Grosso do Sul, que hoje pertence à Votorantim, mas até a década de 1950 era da família Moreira Salles, e ficou conhecida por receber ilustres como os integrantes da banda Rolling Stones.

O diretor prefere não revelar, por enquanto, qual o tamanho da área que foi destinada ao projeto de carbono na fazenda. Mas admite que será superior aos 10 mil hectares do projeto do Cerrado.

A expectativa é de que a certificação para o projeto do Pantanal saia ao longo de 2024 (o chamado concept note, com a metodologia da Verra, já foi feito), mas a primeira comercialização de carbono pode ficar para o início de 2025.

Canassa explica que a cotação do carbono oscila bastante e que as melhores oportunidades de venda costumam ocorrer no primeiro quadrimestre do ano. Além da área própria, o projeto no Pantanal também deve envolver parceria com outros produtores rurais.

Ao todo, a Reservas Votorantim administra atualmente 150 mil hectares de terra, que englobam 3 diferentes biomas: Mata Atlântica, Pantanal e Cerrado.

Na Mata Atlântica a empresa também já começou a faturar com a venda de créditos de carbono. Para isso, foi lançada em setembro de 2023 uma nova metodologia, já que a Verra não aceitava gerar este crédito pelo mecanismo conhecido como REDD. A metodologia é chamada de PSA Carbonflor, foi lançada em Nova York e permitiu a geração de 20 mil créditos de carbono.

David Canassa disse que estavam acumulados os créditos dos últimos 6 anos, portanto o total é de 120 mil. Segundo ele, uma pequena parte já foi vendida. Como se trata de algo novo, o valor foi de US$ 10 por tonelada, mas a empresa agora espera nova oportunidade de mercado para o comercializar o restante.

Parcerias no agronegócio

A Reservas Votorantim espera avançar também em outra vertente de negócio, as oportunidades em conservação e reflorestamento. Durante a COP 28, anunciou uma parceria com a Mesa Brasileira de Pecuária Sustentável, grupo que reúne 70 organizações de produtores rurais, venda de insumos, frigoríficos e até restaurantes.

Pelo acordo, as chamadas “soluções baseadas na natureza”, da Reservas Votorantim, serão oferecidas no marketplace da organização.

Um dos principais serviços é o chamado “arrendamento de reserva legal”. Proprietários rurais que precisem se adequar ao Código Florestal e não queiram substituir lavouras por espécies nativas pagam um valor anual por hectare à Reservas Votorantim, que cuida não apenas da vegetação, mas também da burocracia envolvida.

Vista aérea do Legado Verdes do Cerrado, em Niquelândia, no Norte de Goiás (Foto: Luciano Candisani/Divulgação).

“Ajudamos o proprietário com o CAR. É um processo rápido, em 2 meses resolve o problema. É uma solução mais atrativa do ponto de vista de custo para o agricultor”, explicou o CEO da empresa.

Um acordo semelhante também já existe com a cooperativa Canaoeste, segundo Canassa, e a intenção é conquistar novos clientes no agro. “No último ano fechamos 25 novos contratos, agora que os produtores estão conhecendo essa modalidade de arrendamento de reserva. Muitos achavam que não era possível do ponto de vista legal, mas é”, acrescentou.

A empresa está oferecendo reserva legal para arrendamento nos estados do Paraná, São Paulo, Goiás e Mato Grosso do Sul. “É pouco mais de mil hectares já arrendados até agora, mas temos muita área ainda pra arrendar”.

Outro serviço oferecido ao produtor rural é o plantio de espécies nativas. Como nas APPs não é possível fazer este arrendamento, a saída é reflorestar, uma atividade que a Votorantim faz há bastante tempo.

No reflorestamento, a empresa também sugere alternativas de receita, como o plantio de frutíferas, por exemplo. Em 2023, a Reservas Votorantim diz ter plantado 150 hectares para recuperar APPs em propriedades de terceiros, uma tarefa trabalhosa, segundo Canassa.

A Reservas foi criada em 2015, mas já existia como projeto na Votorantim, desde 2012. “Somente em 2022 fomos a mercado, nossa aproximação com os agricultores é bem recente”, afirma o CEO.

Em 2023, foi o ano do crescimento e de “escalar a receita”, segundo ele, embora não revele os números. A Votorantim deve divulgar os resultados do último ano somente em março.

Canassa garante que não é um “braço” do grupo para cumprir metas. “Se as outras investidas da Votorantim quiserem contratar nossos serviços, podem, vou cobrar preço de mercado”.

O terceiro pilar estratégico está relacionado à biodiversidade das áreas nativas. O diretor diz que estão estudando o futuro mercado de créditos de biodiversidade, ainda muito incipiente. Mas diz que a prioridade é reinvestir os recursos que vem arrecadando em ações de pesquisa, para descobrir mais riquezas na floresta.

“Temos parcerias com universidades e outras instituições para ver o que pode virar produto, como seivas e extratos. Não é só remédio, mas pode vir adstringentes, novos bioprodutos pra agricultura, tem muita coisa interessante para ser pesquisada. É uma vertente de longo prazo”, concluiu.

Informações: Agfeed.

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Evento na UFV vai promover o plantio de cerca de 2 mil mudas neste sábado

No próximo sábado (16), o programa UFV+Sustentável, em conjunto com o Departamento de Engenharia Florestal (DEF), Instituto Estadual de Florestas (IEF), Conservador da Mata Atlântica e Grupo de Estudos em Economia Ambiental e Manejo Florestal (GEEA), realizará, no campus Viçosa, o Dia de Plantio de Mudas, das 7h às 13h.

O evento visa esclarecer sobre diferentes técnicas de reflorestamento e realizar o plantio de cerca de 2 mil mudas em áreas de Preservação Permanente (APP), ao redor de nascentes e cursos d’água. O plantio das mudas, que está ligado à compensação ambiental de diversos licenciamentos da UFV, ocorrerá na Unidade Demonstrativa de Recomposição da Vegetação Nativa em Áreas Protegidas da Universidade, próxima à Uepe- Frigorífico Escola. Todos os participantes terão à disposição um ônibus, que sairá de frente do Restaurante Universitário I.

Toda a comunidade universitária poderá participar das atividades. Haverá emissão de certificados e, para isso, é necessário preencher o formulário de inscrição.

A UFV ressalta que, no dia da atividade, é importante que os participantes usem calçados fechados, calças, blusas de manga comprida, bonés/chapéus e protetor solar, além de levar sua garrafinha de água.

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Guia pioneiro é lançado para identificar mudas de espécies arbustivas e arbóreas para restauração florestal no RS

A Organização das Nações Unidas (ONU) decretou a década da restauração de ecossistemas entre os anos de 2021 e 2030. Com o objetivo de auxiliar o Brasil e o Rio Grande do Sul a alcançar as metas pactuadas para restauração florestal neste período, a Embrapa Clima Temperado lança, neste dia 7 de dezembro, o Guia para Identificação de Mudas de Espécies Arbustivas e Arbóreas de espécies indicadas para Restauração Florestal no Rio Grande do Sul, durante a realização do XVIII Dia de Campo sobre Agroecologia e Produção Orgânica. O guia tem como objetivo ajudar  na correta identificação de mudas de 67 espécies nativas indicadas para restauração de ecossistemas florestais e savonóides no RS. 

O Guia será lançado para identificação de espécies arbustivas e arbóreas indicadas para restauração de ecossistemas florestais nos biomas Pampa e Mata Atlântica, ao se inserir na programação do XVIII Dia de Campo sobre Agroecologia e Produção Orgânica e mais quatro eventos, a II Feira da Agroecologia, a  I Oficina Pedagógica, a Mostra Cultural de Arte e Dança e a Reunião Regional de Organizações de Controle Social, na Estação Experimental Cascata, no interior de Pelotas/RS. “Este é o primeiro para mudas de espécies arbóreas nativas do Estado. Tivemos o cuidado de adaptar a linguagem para o público técnico e agricultores, permitindo que todos acessem o conhecimento de forma igual”, disse um dos pesquisadores  do Grupo de Manejo e Restauração da Vegetação Nativa, Ernestino Guarino.

O Guia de Identificação de Mudas de Espécies Arbóreas para Restauração Florestal do Rio Grande do Sul, de forma ilustrada e didática, é uma publicação que apresenta características-chave para identificação de mudas e sementes das principais espécies arbustivas e arbóreas indicadas para restauração florestal. Nele se encontram uma descrição dos biomas e as regiões onde se realizam a restauração florestal, a forma de tipificação das sementes e sua forma de armazenamento, a própria descrição da seleção das espécies identificadas, acompanhada por suas características e imagens. “Além de apoiar na identificação das mudas que por ventura serão plantadas (adquiridas em viveiros), o Guia ajudará também na identificação das mudas que germinaram em áreas em processo de restauração assistida, ou não – restauração passiva”, explicou.

Os  pesquisadores do Grupo de Manejo e Restauração da Vegetação Nativa, também responsáveis pela obra, explicam que existem diversas estratégias de restauração ecológica, as quais podem ser divididas em dois grandes grupos: técnicas de restauração ativa e técnicas de restauração passiva. Essas estratégias diferenciam-se basicamente pela forma de intervenção humana no processo de sucessão da vegetação. 

A restauração ativa consiste na aplicação de diferentes técnicas de manejo (por exemplo: semeadura direta, plantio de mudas em área total) para a condução da sucessão vegetal;  a restauração passiva baseia-se na capacidade de auto regeneração da vegetação, sendo que a intervenção humana ocorre apenas no diagnóstico e controle das causas de degradação do ambiente (controle de fogo, do gado, da agricultura, entre outros). 

Dentre as diferentes técnicas de restauração ativa, o método mais difundido para a recuperação de áreas degradadas ainda é o plantio de mudas produzidas em viveiro, porém esse método é caro, trabalhoso e geralmente lento. Uma alternativa possível, porém, ainda pouco explorada no Rio Grande do Sul, é a semeadura direta de sementes. Esse método tem como vantagens, o baixo custo de implantação, principalmente quando o objetivo é recuperar grandes áreas e a baixa necessidade de mão de obra especializada. Um dos integrantes do Grupo de Manejo e Restauração é o pesquisador Ernestino Guarino indica que nos últimos anos, várias ações de restauração por meio de semeadura direta vêm sendo feitas em diversos ecossistemas florestais brasileiros. No RS, uma das experiências pioneiras vem sendo realizada por meio do Projeto SAFLegal. Dados de pesquisa recém publicados demonstram  que após 12 meses da semeadura, aproximadamente 25% das sementes emergem, garantindo uma densidade de 2.000 mudas por hectare. Realizado de forma consorciada com grãos, em sistemas agroflorestais, o custo do processo de restauração é de 75% inferior ao método tradicional (plantio de mudas em área total) com mesma  densidade de mudas por hectare. 

“É fundamental gerar tecnologias que reduzam custos e maximizem o uso da mão de obra no processo de restauração, produtiva ou não. Juntamente com a constituição de redes coletoras de sementes e viveiros, integrando diferentes estratégias em nível da paisagem é possível obter maior efetividade com menor custo das atividades de restauração, tornando viável e interesse para o agricultor todo esse processo”, falou. O produtor não recebe recursos financeiros diretamente por optar pela restauração, mas há ganhos na melhoria da água devido a restauração das nascentes, por exemplo. Além disso, é uma obrigação legal de todos os agricultores conservarem as Áreas de Reserva Legal (RL) e Proteção Permanente (APP), mantendo o mínimo exigido na legislação. 

“Para se ter qualidade de mudas e sementes é importante levar em conta que essa garantia não está apenas nas melhores técnicas de coleta, beneficiamento e armazenamento de sementes e produção de mudas de essências florestais, mas também pela correta identificação dessas espécies”, lembrou Ernestino Guarino. Ele relatou que os pesquisadores observaram que os diferentes atores envolvidos na cadeia da restauração florestal no Rio Grande do Sul, apresentam dificuldades para identificar sementes e mudas, incorrendo muitas vezes em erros que podem comprometer ou inviabilizar o processo de restauração florestal. “Algumas espécies são muito parecidas, porém com demandas de solo e clima diferentes”, destacou. Conforme o pesquisador, quando há erros de identificação de mudas de espécies, esses podem causar grandes problemas na restauração, que além de uso de espécies não adaptadas a solo e clima local, podem ser usadas espécies exóticas invasoras, causando prejuízos econômicos e ambientais. 

O Guia compõe um grupo de tecnologias voltadas à inserção da árvore na propriedade rural e a restauração florestal por meio da semeadura direta, apoiando técnicos e agricultores na identificação e definição das espécies utilizadas. Tais tecnologias foram geradas com apoio financeiro da Corsan, do CNPq e do Sistema Embrapa de Gestão de Projetos (SEG), via o projeto SAFLegal.

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Polos florestais são alternativa para reduzir pressão sobre florestas nativas

Florestas plantadas unem inovação à sustentabilidade e se tornam tendência no Brasil 

Estima-se que mais de 20 mil campos de futebol são desmatados em um ano na mata atlântica, o que resulta em 9,6 milhões de toneladas de CO2 lançadas na atmosfera, aumentando o efeito estufa. Como alternativa, os pólos florestais surgem para diminuir este desmatamento por meio das florestas plantadas. 

As plantações têm o solo, localização e clima previamente estudados para garantirem o melhor desenvolvimento das espécies. Em Minas Gerais, estado que concentra a maior cobertura de florestas plantadas do país, está o Pólo Florestal de Mogno Africano, espécie que produz madeira nobre de alta comercialização e valor agregado, além de retornos financeiro e ambiental importantes. 

A madeira nativa do Mogno Africano é reconhecida mundialmente como nobre, sendo a principal substituta do mogno brasileiro (Swietenia macrophylla), espécie ameaçada de extinção. 

O projeto é administrado pelo Instituto Brasileiro de Florestas (IBF), fundado em 2006, responsável por um modelo de negócio único no Brasil. Uma solução de investimento atrelada a sustentabilidade que permite democratizar o acesso ao mercado florestal, possibilitando que pessoas sem terra, conhecimento técnico ou estrutura para o plantio e a gestão florestal possam se beneficiar desse modelo de negócio.

O município de Pompéu, região central de Minas Gerais, já tem mais de 16% de sua extensão coberta por florestas plantadas, correspondendo a mais de 40 mil hectares. Administradas pelo IBF, as florestas são uma oportunidade de investimento. 

Todas as operações são garantidas em contrato: a compra e venda da terra, assim como todo o trabalho florestal. “A parte de mapeamento, delimitação de lotes, condicionamento, plantio, produção das mudas, gerenciamento e manutenções até o final do contrato de prestação de serviço, é responsabilidade do IBF”, explica Gilberto Capeloto, gerente comercial do instituto. 

A facilidade, atrelada à tecnologia, oferece a possibilidade de acompanhar o desenvolvimento da floresta, por meio dos relatórios em um aplicativo exclusivo. O resultado vai muito além do retorno de R$1,5 milhão por hectare. Com as plantações, a exploração de florestas nativas diminui. 

Com menos exploração, as florestas plantadas mantêm a conservação do solo, além de proteger os recursos hídricos e reduzirem o efeito estufa, já que favorecem a retenção de gás carbônico.

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Pizza florestal amarga como fel

Por: Sebastião Renato Valverde, Aléxia Penna Barbosa Diniz e Gabriel Browne de Deus Ribeiro.

Se já não bastasse a cultura vira-lata dos brasileiros de só valorizar as coisas alienígenas e vilipendiar o que vem das terras brasilis, tem que endeusar o que é abstrato e demonizar o concreto, como se evidencia na questão energética. Enquanto o mundo está, como agulha no palheiro, à procura de fontes limpas alternativas aos combustíveis fósseis (petróleo e carvão mineral), alucinando-se com hidrogênio verde e energia geotérmica, aqui as biomassas agrícolas e florestais, limpas e competitivas, sofrem pesadas críticas, sobretudo as da cana-de-açúcar e da madeira de reflorestamento.

Os investimentos no Brasil em energias intermitentes e caras como as eólicas e solares são tratados a “pão de ló”, subsidiando-se, tanto a importação dos materiais, quanto a implantação e operação das usinas. Enquanto as biomassas são trucidadas mesmo já estando provado os benefícios ambientais e seus baixos custos da tonelada vapor e do MWh cogerado, sendo, embora “isso a Globo não mostra”, um terço dos custos com derivados fósseis. Mesmo assim, principalmente a biomassa de reflorestamento, além de criticada, é taxada.

Ainda que o Novo Código Florestal (NCF, Lei 12651/2012) tenha flexibilizado a produção, o corte e o transporte da madeira de reflorestamento ao exigir, para fins de controle, apenas a comunicação ao órgão florestal após pagamento da Taxa Florestal, no entanto quando se trata da madeira para produção de carvão vegetal, único biorredutor renovável, ela ainda depende da autorização do órgão oficial, tendo como fundamento a possibilidade de, após a madeira ser convertida em carvão, tornar-se difícil controlar a origem dela – se de plantações ou de floresta nativa -. Daí a cobrança da taxa tendo como fato gerador o pagamento das análises dos processos, vistorias, acompanhamentos e fiscalizações pelos agentes dos órgãos para controle da cadeia de custódia.

Na verdade, taxam por preciosismo sobre uma parcela ínfima do carvão de madeira nativa com provável origem ilegal que, provado, com certeza precisa ser combatido e punido. Entretanto, há que reforçar que não é pecado consumir este carvão, sendo que para as regiões mais secas e montanhosas de Minas Gerais, quando oriundo de manejo florestal (MF), é solução. Assim também o é quando há desmatamento autorizado para alteração do uso do solo (AUS). Entristece saber que aqueles que realmente precisam dar um fim econômico aos recursos das suas florestas manejando-as e as mantendo de pé, não conseguem dadas as dificuldades impostas e pelo temor criado em carbonizar madeira de nativas.

Assim, por trás desta taxa está o eterno problema do desmatamento ilegal que, como na guerra do combate às drogas, o Brasil está sempre perdendo com suas armas repressoras, da mesma forma é derrotado no combate ao desmatamento. Só que, para piorar, a política de combate ao desmatamento concorre com a que o libera via legislação, exceto no bioma Mata Atlântica.

Mais que repressão, precisa-se de trabalho de inteligência para processar e analisar décadas de informações de fiscalização para o combate ao desmatamento ilegal. Também há que se refletir em decretar moratória temporária ao desmatamento. Pois, não é só a expansão da agropecuária que causa o desmatamento, mas, sim, ele mesmo. Ou seja, o próprio desmatamento é vetor dele mesmo. Quanto mais se desmata, maior a oferta de madeira e materiais lenhosos no mercado, menor os seus preços, menor o valor da árvore em pé e da floresta e maior os seus custos de mantê-la frente a renda das culturas agrícolas concorrentes – teoricamente definido como Custo de Oportunidade da Terra -, além de inviabilizar ainda mais o já tão inviável manejo florestal “sustentável”.

Não está ignorando aqui que alguém esteja consumindo carvão de nativa e outrem o esteja produzindo. O que está em voga é em que condições este carvão esteja sendo produzido? Se manejo ou desmatamento? Se legal ou ilegal? Se legal, em ambas os regimes, nada de errado. Se ilegal, a questão passa a ser discutido no âmbito de política ou polícia. Se oriundo do manejo ilegal há que se saber por que está sendo feito ilicitamente se é possível legalizá-lo. Se por falta de orientação técnica, se por desconhecimento da exigência legal ou por dificuldade de se entender como legalizar? Nestes casos, percebe-se que o problema é político, por distanciamento ou ausência do Estado para junto do produtor. Lembrando sempre que qualquer péssimo manejo será sempre melhor que qualquer excelente desmatamento, então é assessorar o produtor para tal.

Agora, se o problema for desmatamento ilegal com alteração do uso do solo e em grande escala, passa a configurar muito mais um problema de polícia que de política. Em sendo assim, todo rigor da legislação é pouco após o pleno direito de defesa tanto para quem produz, quanto para quem recepta. Quando se trata de pequeno produtor em condições de vulnerabilidade social, aí sim questiona se seria caso de imputar quem já está socialmente punido?

É lamentável se alguma empresa esteja consumindo irresponsavelmente carvão ilegal perante a tanta oferta de carvão de reflorestamento e ao potencial de carvão que poderia estar vindo de AUS e MF autorizados. É deficiência cognitiva, burrice mesmo, pois não faz o menor sentido este possível crime de receptação, haja vista que, infelizmente, a maior parte do material lenhoso resultante das supressões com AUS e do MF autorizados está se perdendo no campo ou tendo um fim nada nobre. Pouco ou quase nada deste material é convertido e consumido como carvão vegetal.

O fato é que a parcela de carvão de nativa no consumo total das empresas é tão pequeno, quase zero, que se desmembrá-lo em situações que beira a criminalidade, ou seja, carvão oriundo do desmatamento em grande escala configurado como caso de polícia, torna-se ainda mais insignificante. O que põe a reflexão se justifica tanto esforço e energia gastos somente na política de comando e controle punitiva, restritiva e coercitiva do órgão florestal e expondo a imagem de toda cadeia de um termorredutor renovável, diferenciado no mundo, quando se poderia converter isso em apoio via fomento e extensão florestal como o qual o órgão foi criado. Basta de repressão, de péssima exposição da cadeia do carvão. Qual tem sido o real custo benefício dessa estratégia?

Para checar esta insignificância do consumo de carvão de nativa basta cruzar os dados de área que o estado libera anualmente para supressão com alteração do uso do solo (AUS) mais o que se permite manejar (MF), fora da Mata Atlântica, multiplicar por uma volumetria conservadora de material lenhoso de 200 m3/ha e dividir por 2 (2m3/mdc – metro de carvão) para se ter uma ideia, somente no território mineiro sem considerar os estados limítrofes, do quanto de carvão se poderia produzir e consumir, verás que “além dos filhos teu não fogem a luta” se poderia dar utilidade para este material lenhoso.

Dados mostram que em 2022, o Estado autorizou a supressão com AUS e MF de 26.700 hectares de vegetação nativa. Isso implica numa conversão em carvão de 2.6 milhões de mdc. Se consumido nas indústrias significaria aproximadamente 10% do total, o dobro do permitido pela Lei 20.922 de 2013 que limitou em 5% do consumo total a partir de 2018. Se não chegou nelas, perdeu-se pela ineficiência burocrática alimentando cupins e microrganismos.

Apesar de ser o carvão uma destinação correta para o material lenhoso, o problema é que, praticamente, ninguém o quer consumir. Depois de décadas de política repressiva maculando a imagem da cadeia produtiva, as empresas traumatizaram-se com o consumo dele. Além disso, dificilmente encontrará alguém no campo querendo carbonizar esta madeira se nem de reflorestamento, que é “mamão com açúcar”, não tem conseguido gente dispostas a tal, quiçá de nativa que é pesada para o trabalho braçal. Ainda mais no meio rural que se encontra desertificado, envelhecido e minifundizado.

Ou seja, a ideia de proteger as florestas a todo custo esquece de quem está ao lado dela a todo momento. As leis feitas por citadinos alojados em escritórios climatizados, mesmo com as melhores intenções possíveis, inviabilizam o manejo feito por grupos que tradicionalmente ocupam regiões próximas às florestas, que precisam de uma atividade econômica para viver e de modo que elas (florestas) sigam existindo em equilíbrio com o restante do ecossistema, já que a proibição absoluta nunca foi a melhor opção.

Estranhamente, a legislação mineira que permite a supressão da vegetação nativa, exigindo a destinação dos resíduos, limita em 5% do total de consumo de carvão pelas siderúrgicas e metalúrgicas. No entanto, não há outro aproveitamento deste material que não seja o carvão dada a baixa qualidade e alta quantidade do material lenhoso inadequado para uma destinação mais nobre como para serraria e laminação. Se só o carvão condiciona os produtores destinarem tal resíduo e se as indústrias não podem e nem querem consumir, então como os produtores cumprirão a lei que o autorizou a desmatar? Com base nisso, questiona se quem deveria arcar com o pagamento das taxas é quem desmatou e não quem consumiu e possibilitou àqueles cumprir com a destinação econômica dos “frutos” do desmatamento.

Diante décadas de fiscalização e combate ao desmatamento, à produção e consumo de carvão e contar com uma série histórica de dados deveria, com trabalho de inteligência dos órgãos, transformá-los em informações que possibilitem, juntamente com a evolução da consciência ambiental, dos canais de denúncia, com os aparatos de vigilância eletrônica e satélite, identificar onde, quem, quanto e quando está cometendo tal crime e puni-los. Para evitar que, por causa de um ou meia dúzia de “gatos pingados” de criminosos, a cadeia produtiva do carvão, que nem de nativa quer mais, tenha que pagar por eles.

Se levar em conta os princípios do direito aplicados a matéria ambiental, tais como os da Razoabilidade, Proporcionalidade, Discricionariedade, Objetividade, da Eficácia e Eficiência e da Presunção da Inocência, além do bom senso, não justifica a continuidade desta política repressora usando dos recursos das taxas florestais. Todo esforço e toda energia gasta no combate a tal desmatamento devem ser custeados por outras fontes de recursos, tais como a Taxa de Reposição Florestal, a Taxa de Compensação Ambiental e as arrecadações das multas ambientais, deixando a taxa florestal para a política de extensão e fomento florestal, como tal foram criados os órgãos florestais (IEFs e IBDF).

Se já é questionável a cobrança por parte das empresas da cadeia do carvão vegetal, mais ainda daquelas que só consomem madeira de reflorestamento, como a da celulose e dos painéis reconstituídos. Por que cobrar taxas destas se só consomem de plantações? É como a produção de grãos (soja, milho, feijão, etc). Apesar de não ter procuração dos agentes da cadeia produtiva da madeira, arrisca-se afirmar que eles continuariam pagando as taxas, desde que o recurso seja usado para a Política e Governança Florestal do estado focada no fomento e na extensão florestal, haja vista que ela (a taxa) está incutida na cultura das empresas e dos produtores florestais. Assim, pagariam para que os produtores tenham melhor e mais fácil acesso aos técnicos dos órgãos florestais. Pois o que se tem hoje é inacessibilidade, forçando os mesmos ou a situação de ilegalidade para a produção florestal ou ao desincentivo dela.

A verdade é que esta cobrança é fruto da sanha arrecadatória abusiva das políticas tributárias no Brasil. Enquanto a taxa florestal era recolhida para o órgão florestal que atuava como uma autarquia promovendo o fomento e a criação e manejo das Unidades de Conservação (UC), tudo bem. O problema é que ela cai no caixa único do Estado, verdadeiro Buraco Negro, e daí, pouco de recurso segue para custear o órgão florestal que, também, de fomento, infelizmente passou a ser única e exclusivamente de fiscalização.

Além disso, o órgão vem, há décadas, sendo desmantelado e sucateado, com redução no quadro de pessoal e de escritórios para atendimento ao público. Diferente dos órgãos de assistência técnica e extensão rural (Emater) que tem capilaridade em quase todos os municípios, o florestal, que já não tinha muito escritório, tem reduzido, inclusive os que eram mantidos via prefeituras.

Urge usar estes recursos da taxa florestal para investir numa estrutura de governança com características compatíveis com as florestais. Ser um órgão com visão de longo prazo, de planejamento estratégico porque assim é a atividade florestal. Com perfil de agencia como a ANA, a ANEEL, etc. Com autonomia, independência de gestão em relação ao poder executivo. Que pense e planeje a atividade para que, assim como não pode faltar energia elétrica (ANEEL) para a sociedade, não pode faltar madeira e carvão para a cadeia consumidora e nem mercado para o produtor. Pois, se sim, ou as empresas fecham, gerando desemprego, problema social, ou elas migram para o carvão mineral, importado, poluidor e excludente gerando impactos socioambientais.

Enfim, este biorredutor renovável, único no mundo, merece tratamento vip por tudo que faz sócio, econômico e ambientalmente, de modo que se alguma empresa desta cadeia produtiva o esteja consumindo ilegalmente tem que ser extirpada como um câncer. Dói ver as operações de combate aos desmatamentos ilegais obcecadas mais na punição dos atores desta cadeia do que, de fato, quem desmatou, ate porque estes não dão o holofote que aqueles dão quando são filmadas as apreensões nos caminhões estacionados nos pátios das indústrias.

O fato é que se for demonstrar num gráfico de pizza o total de carvão consumido nas siderúrgicas/metalúrgicas ver-se-ia que é uma fatia minúscula a parte correspondente ao de nativa perante o total e, sabendo que nela consta o montante oriundo das AUS e MF autorizados – bem aquém do que poderia ser consumido -, então a possível parcela do ilegal é, embora um filete que mal tampa o buraco do dente, o suficiente para deixar a pizza amarga como fel.


Professor Titular do Departamento de Engenharia Florestal da Universidade Federal de Viçosa (DEF/UFV), valverde@ufv.br.

Alexia Penna Barbosa Diniz, Bacharela em direito pela Universidade Federal de Viçosa e mestranda no DEF/UFV, alexia.diniz@ufv.br.

Professor Adjunto do Departamento de Ciências Florestais e da Madeira da Universidade Federa do Espírito Santo (DCFM/UFES), gabriel.d.ribeiro@ufes.br.

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