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Cidades verdes e resilientes: o papel das florestas urbanas

*Artigo de Cícero Ramos

Atualmente, mais da metade da população mundial vive em áreas urbanas, e essa proporção tende a aumentar. Com esse crescimento, os problemas ambientais nas cidades têm ganhado maior atenção, já que afetam as pessoas de diversas formas e intensidades. Diante desse cenário, é fundamental que o Poder Público adote medidas eficazes para controlar a degradação ambiental que impacta os centros urbanos. Esses desafios exigem que os municípios incorporem práticas sustentáveis como parte essencial das soluções.

Agenda 2030, da Organização das Nações Unidas (ONU), reconhece a sustentabilidade urbana como um elemento-chave para o desenvolvimento sustentável. Um dos seus objetivos, o ODS 11 (Objetivo de Desenvolvimento Sustentável 11), visa “tornar as cidades e os assentamentos humanos inclusivos, seguros, resilientes e sustentáveis”. Nesse contexto, as Florestas Urbanas emergem como uma das melhores respostas para os desafios ambientais das cidades, desempenhando um papel crucial na melhoria da qualidade de vida urbana.

As cidades precisam de florestas. Esses espaços verdes desempenham funções vitais, como a regulação do clima, o armazenamento de carbono, a remoção de poluentes do ar, a redução do risco de enchentes, o apoio à segurança alimentar, energética e hídrica, e a promoção da saúde física e mental da população. Além desses benefícios, as florestas urbanas contribuem para a estética das cidades, tornando-as mais agradáveis, atrativas e humanizadas.

A criação e manutenção dessas áreas verdes envolvem o plantio, a condução e o manejo de árvores e plantas em espaços urbanos, como ruas, praças e parques. Essas ações visam proporcionar benefícios ambientais, como a melhoria da qualidade do ar, a absorção de dióxido de carbono (CO₂) e a liberação de oxigênio (O₂), além da captura de partículas poluentes, que são prejudiciais à saúde respiratória. As florestas urbanas também ajudam a mitigar o efeito das “ilhas de calor”, comuns nas áreas urbanas. Uma área arborizada pode reduzir a temperatura em mais de 7°C em comparação com locais expostos ao sol, proporcionando maior conforto térmico e umidade do ar.

A expansão de áreas verdes urbanas, seja por meio de arborização, criação de parques naturais ou formação de “jardins de chuva”, representa uma medida preventiva eficaz para a redução de enchentes. Essas iniciativas funcionam como “esponjas” no ambiente urbano, absorvendo e retendo as águas pluviais, regulando o fluxo hídrico e diminuindo o risco de enchentes nas cidades. Essas ações não apenas melhoram a qualidade de vida nas áreas urbanas, mas também promovem a sustentabilidade ambiental.

Além dos ganhos ambientais, as florestas urbanas trazem benefícios sociais. Elas melhoram os espaços públicos, tornando as cidades mais agradáveis, acessíveis e seguras para pedestres e ciclistas. Ambientes arborizados incentivam o convívio social e promovem atividades ao ar livre, como caminhadas, lazer e interação entre as pessoas. A presença de áreas verdes também está associada à redução do estresse e de doenças relacionadas à poluição e ao sedentarismo, o que pode resultar em menores gastos com saúde pública.

No entanto, a implementação e manutenção de florestas urbanas enfrentam desafios, como a falta de planejamento adequado, o crescimento desordenado das cidades e a escassez de recursos para manutenção. É essencial que os projetos considerem a escolha de espécies adequadas e a integração da vegetação com as demais infraestruturas urbanas. O planejamento urbano deve garantir que as árvores se tornem parte essencial da cidade, e não obstáculos ou fontes de problemas. Para isso, é imprescindível a participação de profissionais qualificados, como engenheiros Florestais, que podem contribuir com conhecimentos técnicos e científicos.

O Brasil dispõe de amplo conhecimento, infraestrutura e profissionais capacitados para apoiar os municípios nessa jornada. Não é mais aceitável que as cidades brasileiras, independentemente de seu tamanho, não priorizem o planejamento, a implantação, a manutenção e o manejo das florestas urbanas. O país tem todos os recursos necessários para transformar suas cidades em espaços mais verdes, sustentáveis e resilientes.

Investir em florestas urbanas é um compromisso com um futuro mais equilibrado e saudável. Cidades bem arborizadas são capazes de se recuperar mais rapidamente de desastres naturais, como enchentes, secas e tempestades, tornando-se mais resilientes. Esse investimento não só melhora a qualidade de vida atual, mas também garante um legado positivo para as próximas gerações.


*Cícero Ramos é engenheiro Florestal e vice-presidente da Associação Mato-grossense dos Engenheiros Florestais.

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Bosque de Curitiba reduz a temperatura em até 4ºC

Uma das mais bem preservadas florestas urbanas da capital paranaense, o Bosque Reinhard Maack, foi cenário de um estudo realizado, ao longo de três anos, pela Embrapa Florestas (PR) para avaliar a temperatura e o fluxo de gases de efeito estufa (GEE). Com o tema Contribuição de uma floresta urbana na atenuação da temperatura do ar para enfrentamento da mudança do clima: caso do Bosque Reinhard Maack, o trabalho apresenta resultados importantes, com destaque para a significativa redução da temperatura média do ano no interior da floresta, de até 4°C, quando comparada com áreas externas próximas ao bosque. Os dados mostram e reiteram a importância dos remanescentes florestais urbanos, no âmbito dos microclimas, para o enfrentamento de mudanças climáticas, diante das altas emissões de gases de efeito estufa nas cidades.

Esses resultados provêm de um amplo estudo componente da Rede Saltus, no projeto “Dinâmica de gases de efeito estufa e dos estoques de carbono em florestas naturais e plantadas: práticas silviculturais para mitigação e adaptação à mudança climática”. De forma complementar, outro estudo associado a esse que avaliou a temperatura e identificou a possível contribuição do bosque para o microclima local foi o trabalho de conclusão de curso (TCC) da aluna de agronomia Laura Malage, da Universidade Federal do Paraná (UFPR) e bolsista do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq) na Embrapa Florestas.

Nesse estudo foi feita a fitossociologia da área para indicar as espécies florestais de maior ocorrência, além da avaliação dos gases de efeito estufa e a determinação do estoque de carbono no solo e na vegetação, considerando a sua relação com a estrutura e a composição do remanescente florestal. Os dados finais permitiram avaliar o potencial do bosque na mitigação de GEE. Segundo os pesquisadores da Embrapa responsáveis pelo estudo, Marcos Rachwal (foto) e Josiléia Zanatta, o diferencial desse trabalho se dá pelo amplo escopo de aspectos avaliados e pelo tempo de monitoramento da área urbana.

O bosque urbano Reinhard Maack, onde o estudo foi desenvolvido, é um remanescente de Floresta Ombrófila Mista (FOM), também conhecido como floresta com araucária ou pinheiral, localizado ao sul da capital paranaense. Em 1989, ano de sua implantação, o principal objetivo era a promoção da educação ambiental. “O alto grau de conservação desse bosque, aliado ao fato de estar localizado em uma região onde os remanescentes florestais nativos e arborização urbana são escassos, foi um dos motivos da escolha”, explica Rachwal.

Resultados sugerem políticas públicas de conservação desses espaços em centros urbanos

As temperaturas no bosque foram monitoradas entre abril de 2019 e junho de 2022, em quatro locais preestabelecidos: na rua externa ao bosque, no estacionamento externo, na borda próxima à entrada da trilha, e no interior da mata. No período observado, a amplitude térmica nas áreas avaliadas foi de 8,7 °C a 33,6 °C, com variações em função das diferentes posições e estações do ano. No interior, a temperatura média anual foi de 17,1 °C. Na entrada do remanescente, o valor médio foi de 19,1 °C. No estacionamento, posicionado um pouco mais longe do bosque, mas com algum sombreamento de árvores, a temperatura foi de 19,7 °C. No local mais afastado, em frente a um sobrado residencial, na esquina do bosque, o valor médio de temperatura foi de 20,9 °C.

“No caso desse estudo, a presença de árvores no estacionamento e mesmo na borda da mata nativa já amenizou a temperatura do ar observada na rua, em mais de 1 ºC, em praticamente todas as estações”, observa Rachwal. “É importante que tenhamos mais áreas verdes para multiplicar o efeito de arrefecimento da temperatura, mesmo em uma escala local”, complementa Zanatta.

Além desse trabalho, poucos estudos abordaram o potencial de contribuição dos bosques urbanos. Entre eles, está o que avaliou o parque Chapultepec, no México, ao apresentar no interior da floresta urbana uma redução de 2 ºC a 3 ºC de temperatura, comparada aos arredores construídos. Outra avaliação feita em praças de Maringá (PR) apontou diferenças de 2 ºC a 3,8 ºC entre áreas sombreadas pelas árvores e áreas com radiação direta. Também em Curitiba, mais um trabalho mostrou temperaturas de 2,3 ºC maiores em áreas da cidade do que no interior de florestas urbanas. Esses estudos e outros que vêm sendo realizados reforçam a diferença microclimática proporcionada pela vegetação nos centros urbanos.

De acordo com os pesquisadores, é perceptível um padrão de redução da temperatura à medida que a mata nativa se torna mais próxima. Isso se deve à interceptação da radiação pela copa das árvores, que converte a energia em calor, proporciona sombreamento e assim reduz as temperaturas das superfícies dos objetos sombreados. Também ocorre a liberação de água pela respiração das folhas, resfriando o ambiente. “Esses mecanismos são exemplos de como os ecossistemas florestais urbanos atuam em diferentes esferas no enfrentamento às mudanças climáticas, seja para atenuação da temperatura e conforto térmico, ou para infiltração e armazenamento de água no solo. Esses aspectos justificam a necessidade de políticas públicas que estimulem a conservação e ampliação desses espaços, visando atenuar os impactos da mudança do clima”, destaca Rachwal.

Figura 1 – Ao longo dos anos a urbanização na região próxima ao Bosque Reinhard Maack transformou a paisagem, com a conversão de áreas naturais em estruturas urbanas (Figura 1). Imagem superior corresponde ao ano de 1952, e inferior ao ano de 1990. Fonte: Adaptado de IPPUC (2021).
Figura 2 – Imagem 3D do Bosque Reinhard Maack e indicação dos pontos de investigação da temperatura do ar. (1) Rua externa ao bosque, esquina das ruas Waldemar Kost e Conde de São João das Duas Barras; (2) estacionamento externo do bosque; (3) borda do bosque próxima à entrada da trilha; e (4) interior da mata. Fonte: Adaptado de IPPUC (2019).

Araucária tem papel fundamental no estoque de carbono

Um importante resultado do estudo foi a realização do inventário florestal no Bosque Reinhard Maack. O trabalho fez também estimativas do estoque de carbono nos compartimentos vegetais e no solo, bem como o monitoramento da temperatura e dos fluxos de N2O (óxido nitroso), CH4 (metano) e CO2 (dióxido de carbono) durante três anos.

No inventário florestal e no estudo fitossociológico que integraram a pesquisa, foram amostrados 501 indivíduos, que estão distribuídos em 27 famílias botânicas e 39 espécies lenhosas conhecidas. “O estudo apontou que o carbono da biomassa de Araucaria angustifolia, em conjunto com Allophylus edulis e Jacaranda micrantha representou 54% do total armazenado”, afirma a graduanda. A Araucaria angustifolia desempenhou papel fundamental no estoque de carbono, com valor de 40 toneladas por hectare (t/ha). Laura Malage afirma que a árvore-símbolo do estado do Paraná representou 39% do estoque de carbono contido na biomassa do bosque, ressaltando a importância dessa espécie longeva para o carbono.

O remanescente apresentou estoques de carbono correspondentes a 260 t/ha, compostos por 6 t/ha na serrapilheira, 102 t/ha na biomassa vegetal e 152 t/ha no solo na profundidade de até 1 metro. Com área de 7,8 ha, o carbono armazenado no bosque foi de mais de 2 mil toneladas. A emissão acumulada anual de óxido nitroso foi de 1 kg/ha de nitrogênio na forma de N2O por hectare por ano; a absorção de metano foi de 7 kg de carbono na forma de CH4 por hectare por ano, e a emissão de gás carbônico igual a 11 kg de carbono/ha/ano. Houve uma compensação de 51% da emissão de N2O pela absorção de CH4.

Mitigação x adaptação

Entre as ações possíveis para atenuar os efeitos das mudanças climáticas está a mitigação. Esta se relaciona com a redução de emissões de GEE. Por outro lado, a adaptação indica mecanismos que auxiliam as comunidades na resiliência diante dos impactos causados. Nesse sentido, os ecossistemas florestais em meio urbano podem atuar como serviços ecossistêmicos no sequestro e estoque de carbono, regulação climática, regulação dos fluxos de água, purificação do ar, além de proporcionar bem-estar à comunidade.

Informações: Embrapa Florestas.

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