Os desafios da silvicultura frente às mudanças climáticas

*Artigo por MARCOS LEANDRO KAZMIERCZAK.

Este artigo apresenta em primeira mão os resultados preliminares da análise de 521.705 imóveis rurais com Silvicultura no Brasil. Foram realizadas operações de álgebra espacial entre os limites destes imóveis (base de setembro de 2025) e as seguintes variáveis climatológicas: Precipitação total anual; Precipitação diária extrema (em um dia); Número máximo de dias secos consecutivos; Temperatura máxima; e Número de dias muito quentes no ano.

A análise foi realizada com base em dois cenários de emissão de Gases de Efeito Estufa (GEE):

  • O Cenário RCP 4.5 representa um caminho intermediário em termos de emissões de GEE, considerando uma certa estabilização na atmosfera ao longo deste século. No entanto, mesmo nesse cenário, as temperaturas globais continuariam a aumentar, embora em um ritmo mais lento do que em cenários com emissões mais altas. Considera o equilíbrio entre o otimista e o pessimista, oferecendo uma visão do futuro em que as ações de mitigação das mudanças climáticas começam a surtir efeito, mas os impactos já sentidos continuarão a se manifestar por décadas.
  • Já o Cenário RCP 8.5 Representa o cenário mais extremo de emissões de GEE, delineando um futuro em que as emissões continuam a crescer em um ritmo acelerado ao longo deste século. Essa trajetória de altas emissões tem implicações profundas para o clima global, com consequências potencialmente devastadoras para diversas regiões do planeta. Ao utilizar o RCP 8.5 em modelos climáticos, se busca entender os possíveis impactos de um cenário onde as ações de mitigação são mínimas e a dependência de combustíveis fósseis permanece elevada.

As cinco variáveis foram processadas em relação ao Cenário Histórico (1961-1990) e nestes dois cenários futuros, pois os resultados das suas projeções permitem analisar a tendência e a magnitude da variação da temperatura, do volume de chuva, do risco de estiagem e de temporais, bem como das ondas de calor, que podem desencadear eventos climáticos extremos ainda mais frequentes e intensos. Entender os possíveis impactos destes cenários é fundamental para tomar decisões mais assertivas para a Silvicultura das próximas décadas.

A seguir, uma breve contextualização de cada variável e os respectivos resultados, considerando-se estes dois cenários acima, comparando os valores gerados pelas simulações até 2040 com o referencial 1961-1990.

Análise dos Cenários de Precipitação Anual

Expressa a distribuição espacial do volume de chuva anual, e permite a comparação entre diferentes locais, o que facilita identificar regiões com maior ou menor variabilidade na precipitação, crucial para estudos de regionalização climática e análise de tendências. Esta informação é fundamental para a gestão de recursos hídricos e a avaliação de riscos. Em estudos de modelagem climática, o coeficiente de variação é utilizado para calibrar e validar os modelos, garantindo que eles sejam capazes de reproduzir a variabilidade observada na precipitação.

O gráfico de barras compara as projeções de aumento e redução no volume anual de chuva para os cenários RCP 4.5 (estabilização das emissões) e RCP 8.5 (continuidade do aumento das emissões).

  • No cenário RCP 4.5 (estabilização), a maioria dos imóveis rurais com Silvicultura (60,86%) tem uma projeção de aumento na precipitação anual.
  • No cenário RCP 8.5 (aumento contínuo), essa porcentagem é menor (56,71%), indicando que a aceleração das emissões não necessariamente leva a mais chuvas para todos os imóveis, mas sim a uma distribuição mais irregular.
  • A porcentagem de imóveis com projeção de redução de chuva é maior no cenário RCP 8.5 (43,29%) do que no RCP 4.5 (39,14%). Isso indica que, no cenário de emissões mais altas, a tendência de redução de chuva se torna mais pronunciada para mais de 40% das propriedades rurais analisadas.

A principal conclusão é que a variabilidade da precipitação se intensifica em ambos os cenários, não havendo áreas de estabilidade. O cenário de emissões mais altas (RCP 8.5) não apenas aumenta a probabilidade de redução de chuvas, mas também diminui a porcentagem de imóveis que experimentariam um aumento. Isso aponta para um futuro onde a gestão da água se torna um desafio crescente e mais crítico para a Silvicultura no Brasil.

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Fonte: KAZ Tech [2025]

Análise dos Cenários de Precipitação Diária Extrema

Esta análise permite quantificar a variabilidade na ocorrência e intensidade de chuvas torrenciais, auxiliando na caracterização desses eventos extremos e na identificação de padrões de comportamento. Fornece informações essenciais para o planejamento e gestão de recursos hídricos, dimensionamento de obras de drenagem e desenvolvimento de sistemas de alerta precoce.

O gráfico de barras compara as projeções de aumento, ausência de alteração e redução na ocorrência de precipitação diária extrema para os dois cenários:

  • No cenário RCP 4.5 (estabilização das emissões), a maioria dos imóveis (67,77%) tem uma projeção de aumento na frequência ou intensidade de chuvas extremas em 24 horas.
  • No cenário RCP 8.5 (aumento contínuo das emissões), a porcentagem de imóveis com aumento na precipitação diária extrema é ligeiramente menor (62,90%), mas ainda representa uma vasta maioria.
  • No cenário RCP 8.5, uma porcentagem maior de imóveis (37,10%) tem uma projeção de redução na ocorrência de temporais em comparação com o cenário RCP 4.5 (32,23%). Essa diferença sugere que, à medida que as emissões aumentam, a frequência de eventos extremos de chuva pode diminuir em algumas regiões, provavelmente concentrando-se em outras.

A principal conclusão é que, independentemente do cenário, a Silvicultura enfrentará uma intensificação da dinâmica da precipitação diária extrema, que usualmente trazem consigo vendavais. Enquanto o cenário de emissões moderadas (RCP 4.5) aponta para um aumento mais generalizado de temporais, o cenário de altas emissões (RCP 8.5) indica uma distribuição mais irregular desses eventos, onde algumas áreas terão redução e outras, um aumento significativo. Isso destaca a necessidade de estratégias de gestão de riscos e adaptação específicas para cada região, considerando a variabilidade do clima futuro.

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Fonte: KAZ Tech [2025]

Análise dos Cenários de Dias Secos Consecutivos

Este tipo de análise caracteriza períodos secos, quantificando a variabilidade da sua duração, ou seja, quão diferentes podem ser esses períodos em termos de extensão temporal. Permite avaliar riscos, pois a variabilidade dos períodos secos é fundamental para a avaliação de riscos associados à seca, como a redução da disponibilidade de água para os plantios. Subsidia o planejamento e gestão de recursos hídricos, essencial para o dimensionamento de reservatórios e desenvolvimento de procedimentos internos de uso da água.

O gráfico de barras compara as projeções de aumento, ausência de alteração e redução no número máximo de dias secos consecutivos para os dois cenários:

  • No cenário RCP 4.5 (estabilização das emissões), a imensa maioria dos imóveis (97,72%) tem uma projeção de aumento no número de dias secos consecutivos.
  • No cenário RCP 8.5 (aumento contínuo das emissões), essa porcentagem é ligeiramente menor, mas ainda extremamente alta (97,34%). Isso sugere que, em ambos os cenários, o risco de estiagem se tornará um problema generalizado.
  • A porcentagem de imóveis com projeção de redução no número de dias secos consecutivos é extremamente pequena em ambos os cenários (2,28% para RCP 4.5 e 2,65% para RCP 8.5). Essa redução é marginal e não compensa o aumento esmagador na maioria das propriedades.

A principal conclusão do gráfico é que o aumento no número de dias secos consecutivos é a tendência dominante em ambos os cenários, independentemente do nível de emissões. Isso indica que a Silvicultura brasileira enfrentará um aumento significativo e generalizado no risco de estiagem. O cenário mais extremo (RCP 8.5) não traz um alívio notável para esse problema; em vez disso, a diferença entre os cenários é mínima, confirmando que a seca é uma ameaça iminente e onipresente para o setor, exigindo estratégias robustas de adaptação e gestão de recursos hídricos.

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Fonte: KAZ Tech [2025]

Análise dos Cenários de Temperatura Máxima

O aumento da temperatura máxima é um fator crítico para a produtividade de florestas plantadas. Temperaturas elevadas podem causar estresse térmico nas árvores, o que afeta diretamente seus processos fisiológicos. A fotossíntese, por exemplo, que é a base da produção de biomassa e crescimento, pode ser inibida em condições de calor extremo, já que as árvores fecham os estômatos para economizar água, mas, ao fazer isso, reduzem a absorção de dióxido de carbono. Além disso, temperaturas muito altas podem acelerar a evapotranspiração, aumentando a demanda por água e agravando os efeitos de períodos de seca.

Esse estresse térmico, somado à maior frequência de dias muito quentes, afeta o metabolismo da planta e pode comprometer o crescimento e a qualidade da madeira. A imagem da “Dinâmica da Temperatura Máxima” mostra que 100% dos imóveis rurais com Silvicultura no Brasil terão um aumento na temperatura máxima e no número de dias muito quentes, independentemente do cenário de emissões. Essa tendência universal e inevitável representa um desafio significativo para a produtividade futura, pois o calor extremo pode limitar o potencial genético das árvores de crescimento rápido e tornar as florestas mais vulneráveis a pragas e doenças, além de aumentar o risco de incêndios florestais.

  • Tanto no cenário RCP 4.5 (estabilização das emissões) quanto no RCP 8.5 (aumento contínuo das emissões), 100% dos imóveis rurais com silvicultura no Brasil têm uma projeção de aumento na temperatura máxima.
  • Para ambos os cenários, a projeção é de 0% de imóveis sem alteração ou com redução na temperatura máxima.

A análise da imagem leva a uma conclusão direta e inequívoca: o aumento da temperatura máxima é um fenômeno universal e inevitável para a Silvicultura brasileira, independentemente do nível de emissões futuras. Isso significa que não há áreas de refúgio climático em relação ao calor. O risco de ondas de calor, estresse térmico em plantas e trabalhadores e o aumento da evapotranspiração se tornam ameaças onipresentes para o setor, exigindo estratégias de adaptação urgentes e generalizadas.

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Fonte: KAZ Tech [2025]

Análise dos Cenários de Dias Muito Quentes no Ano

Esta última análise caracteriza ondas de calor, ou seja, dias extremamente quentes. As ondas de calor podem ter impactos significativos na saúde humana, agricultura, infraestrutura e ecossistemas. Ao entender a variabilidade da temperatura máxima, podemos avaliar melhor os riscos associados a esses eventos extremos e planejar medidas de adaptação.

O gráfico de barras compara as projeções de aumento, ausência de alteração e redução no número de dias muito quentes.

  • Tanto no cenário RCP 4.5 (estabilização das emissões) quanto no RCP 8.5 (aumento contínuo das emissões), a projeção é de 100% dos imóveis rurais com silvicultura no Brasil experimentando um aumento no número de dias muito quentes.
  • Para ambos os cenários, a projeção é de 0% de imóveis sem alteração ou com redução no número de dias muito quentes.

A análise da imagem leva a uma conclusão direta e alarmante: o aumento no número de dias muito quentes é um fenômeno universal e inevitável para a Silvicultura no Brasil, independentemente do nível de emissões futuras. Isso significa que não há áreas de refúgio climático em relação às ondas de calor. O risco de estresse térmico em plantas e trabalhadores e o aumento da vulnerabilidade a incêndios florestais se tornam ameaças onipresentes para o setor, exigindo estratégias de adaptação urgentes e generalizadas.

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Fonte: KAZ Tech [2025]

*Marcos Leandro Kazmierczak é Consultor Sênior de Geotecnologias na KAZ Tech.

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