No entanto, ainda restam dúvidas sobre quando o TFFF começará a mobilizar capital privado
O início do processo para capitalização do Fundo Florestas Tropicais para Sempre (TFFF, em inglês) foi considerado pelo governo brasileiro e por especialistas um dos principais avanços da COP30. A Presidência do Brasil garantiu US$ 6,7 bilhões em compromissos de aporte no fundo. O valor foi comemorado por integrantes dos Ministérios da Fazenda e do Meio Ambiente, que lideraram a iniciativa, ainda que não tenha alcançado a meta de US$ 10 bilhões.
Apesar de pontos nebulosos, como dúvidas sobre quando de fato o fundo começará a mobilizar capital privado e fazer os primeiros desembolsos, especialistas avaliam o mecanismo como uma iniciativa inovadora, porque, quando concretizada, contribuirá para mitigar o aquecimento global ao auxiliar na preservação das florestas, que absorvem dióxido de carbono (CO2), principal gás causador do efeito estufa. O TFFF também é elogiado por não precisar de doações e por garantir um fluxo contínuo de remuneração aos países para preservação de suas florestas.
“Pela primeira vez numa COP, um instrumento de solução ambiental pôde efetivamente sair do papel”, afirmou o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, em coletiva de imprensa durante a COP para anunciar os aportes no TFFF. “Já temos aqui mais da metade dos recursos que tínhamos nos colocado como meta nesse primeiro ano”, reforçou a ministra do Meio Ambiente, Marina Silva. “Essa é a COP da implementação, e o TFFF significa implementação, ao viabilizar os recursos necessários para que possamos proteger as florestas”, completou.
André Guimarães, diretor-executivo do Instituto de Pesquisa Ambiental da Amazônia (Ipam) e enviado especial da sociedade civil para a COP30, considera o fundo uma ferramenta muito bem pensada, sobretudo porque tem essa visão de remunerar a floresta que não é derrubada. “É um sinal, no meu entender, muito poderoso de que as florestas têm valor. Depois de a gente não conseguir, infelizmente, avançar nos combustíveis fósseis, é ainda mais importante pactuarmos em torno de manter e recuperar florestas”, afirmou.
Já temos mais da metade dos recursos que tínhamos nos colocado como meta nesse 1º ano”
— Marina Silva
Ronaldo Seroa Motta, colaborador do Earth Innovation Institute (EII) e professor de economia da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ), estima que a tração que o TFFF ganhou na COP de Belém foi importante para que esse mecanismo se firme como um modelo de financiamento climático. “Espero que o TFFF tenha mais adesões e se consolide como um ponto focal de financiamento da conservação florestal. A preservação da floresta colabora não só reduzindo as emissões, como capturando CO2. É um caminho mais barato do que construir um depósito de CO2, chamado de CCS [Captura e Armazenamento de Carbono].”
A ministra do Ambiente e Desenvolvimento Sustentável da Colômbia, Irene Vélez, destacou que o TFFF terá o papel no futuro de assegurar um fluxo contínuo de financiamento. “Muitos programas [de conservação] nos países são relacionados à política atual. Quando o governo muda, todos esses esforços de conservação podem diminuir. Então, a ideia de ter uma continuidade de financiamento é crucial para ver a floresta realmente se fortalecer”, disse Vélez durante painel sobre o TFFF na COP30.
O fundo busca levantar US$ 125 bilhões, sendo US$ 25 bilhões de capital público e o restante, privado. A ideia é que os valores sejam investidos e parte da remuneração seja revertida para remunerar os países que preservam suas florestas tropicais. É diferente, por exemplo, do Fundo Amazônia, que é baseado em doações por parte dos países.
Durante a COP em Belém, a Noruega se comprometeu a aportar US$ 3 bilhões até 2035 no TFFF; a Alemanha, 1 bilhão de euros (US$ 1,15 bilhão); e a França, 500 milhões de euros (US$ 577 milhões) até 2030. Antes, o Brasil e Indonésia já haviam anunciado US$ 1 bilhão cada. Além disso, mais de 50 países endossaram a declaração da COP30 sobre o TFFF, confirmando o “interesse e apoio político”.
Na declaração, os países citam que se trata de uma “iniciativa inovadora concebida para fornecer recursos previsíveis, permanentes e em larga escala para a conservação das florestas tropicais em países em desenvolvimento, por meio de um mecanismo de financiamento misto que mobiliza capital público e privado e que, de forma baseada em resultados, destina fundos à conservação e ao uso sustentável das florestas tropicais.”
Há, contudo, uma série de dúvidas sobre quando os aportes anunciados serão de fato concretizados, já que os países ainda precisam formalizar o compromisso de investimento e explicitar quais são as condicionantes. Além disso, o fundo precisa ter ao menos US$ 10 bilhões de capital público para começar a alavancar capital privado e, então, fazer os primeiros desembolsos. Foi um pedido da Noruega, para não ter mais que 20% do capital público aportado.
Integrantes do governo brasileiro afirmam que até novembro do próximo ano, quando a presidência da COP será transferida para Turquia e para a Austrália, será possível chegar próximo aos US$ 10 bilhões de capital inicial, para alavancar US$ 40 bilhões em recursos privados, por meio da emissão de títulos. Também acreditam que em três anos será possível chegar ao objetivo completo de levantar US$ 125 bilhões. Eles explicam que é natural que haja uma demora na capitalização, porque os países ainda precisam cumprir etapas internas antes de fazer o aporte de fato no fundo.
Também há a expectativa que mais países anunciem aportes, em especialmente a China. Isso porque somente em outubro deste ano o Banco Mundial foi confirmado como administrador do TFFF. Essa parceria é considerada pelo governo como essencial para garantir que o fundo opere com os mais altos padrões de governança, criando condições para que mais países sintam segurança em aderir. O banco também atuará como trustee, repassando recursos gerados pelos TFFF aos governos.
Diretora-geral da Iniciativa Internacional da Noruega para o Clima e as Florestas (NICFI, na sigla original), Dyveke Rogan avaliou que é normal que haja incertezas por parte dos países sobre aportar ou não recursos no TFFF, porque trata-se de um mecanismo novo. “Nós [Noruega] chegamos à conclusão de que, sim, há certos riscos para gerar esse retorno do investimento que deve ser distribuído para os países. Mas, para nós, o risco de não construir esse mecanismo que irá garantir um fluxo estável [de recursos] para os países florestais é muito mais alto”, argumentou Rogan, em painel para debater o TFFF.
Ela conclamou para que mais países venham aderir, de forma a garantir o sucesso do fundo. “O TFFF pode funcionar somente se nós conseguirmos fazer isso em escala. Portanto, eu encorajo outros patrocinadores que estão olhando para isso a se engajarem.
Informações: Valor / Globo








