Dois grandes projetos que necessitarão de madeira despontam na Região Sul. Enquanto a CMPC projeta a implementação de uma fábrica de celulose em Barra do Ribeiro, no Centro-Sul do Estado, a Braspell Bioenergia avança nos trâmites para a instalação de uma fábrica de pellets em Pinheiro Machado, no Sul gaúcho. Quando saírem do papel, ambos prometem impulsionar a silvicultura nas respectivas áreas em que estão inseridos.
No caso da CMPC, é esperado um investimento de R$ 24 bilhões na execução do projeto, parte do histórico aporte anunciado pela empresa para o Rio Grande do Sul. Do valor, R$ 4 bilhões serão destinados a operações portuárias, ao plantio florestal de eucaliptos e à hidrovia. A empresa optou por não divulgar qual deverá ser a área plantada.
A CMPC possui atualmente área plantada de eucaliptos em 75 municípios gaúchos. Somando as áreas de conservação, a empresa possui 357 mil hectares no Estado — um crescimento de 10,27% em relação aos dados divulgados na última edição do Mapa Econômico do RS.
O presidente da Associação Gaúcha de Produtores de Florestas Plantadas (Agaflor), Mathias Almeida, acredita que um município próximo à nova fábrica da CMPC que pode ter a silvicultura ampliada é o de São Lourenço do Sul, na Região Sul do Estado. Atualmente, a cidade possui pouco menos de 2,9 mil hectares de área florestal plantada, sendo a maioria (2,65 mil hectares) voltada ao cultivo de pinus — volume bastante distante dos principais produtores da região.
Outra possibilidade de crescimento em área de plantio florestal, para Almeida, é no município de Canguçu. Embora já figure como o quinto maior produtor da Região Sul, com cerca de 16,3 mil hectares de florestas de eucalipto, pinus e acácia negra, o presidente da Agaflor acredita que o tamanho do município permite a expansão silvícola. A cidade, localizada na Região Sul do Estado, possui uma área de 3.526 quilômetros quadrados, sete vezes maior que a da capital gaúcha, Porto Alegre.
O presidente da Associação Gaúcha de Empresas Florestais (Ageflor), Daniel Chies, por sua vez, prefere não prever cidades específicas que possam crescer em área florestal. Porém, confia que os empreendimentos são responsáveis por dar aos produtores a segurança para investir na silvicultura, visto que ele se dá a médio e longo prazo. Esse seria, para ele, o caso da nova fábrica da CMPC. “Com certeza é um projeto que irá estimular empreendedores a analisarem a possibilidade de investimentos em plantios florestais”, avalia.
O outro projeto que promete alavancar a Região Sul, da Braspell, conta com investimento do empresário paulista Luiz Eduardo Batalha e está na etapa final do licenciamento necessário para a sua instalação. Anunciada em 2021 com um aporteestimado em R$ 1,4 bilhão, a fábrica planeja utilizar cilindros de madeira compactada para geração de energia a partir da queima de biomassa.
No projeto, é estimado o plantio de 45 mil hectares de florestas para o fornecimento da matéria-prima. As espécies não foram especificadas. No entanto, o empresário espera que outros fornecedores se juntem ao projeto. “Temos parceiros produtores de eucalipto, de pinus, de acácia negra, e vai ser um projeto muito grande”, explica Batalha. É possível que até 90 mil hectares de florestas plantadas a um raio de 60 quilômetros da fábrica possam ofertar madeira para a produção de pellets.
Almeida concorda com a previsão: “Eles já tem uma boa parte das florestas para começar a rodar o projeto deles mapeada. Eu acho que se realmente sair do papel, o que eu acho que vai andar, vai ser um boom para aquela região. Principalmente, se a gente considerar a silvicultura em áreas marginais que não iriam para a soja ou áreas das propriedades que tenham 50, 100 hectares para diversificar a fonte de renda”, avalia.
Chies diz esperar fortemente que o projeto seja executado. Entretanto, acredita que a escala estipulada pela Braspell possa ser um desafio para a sua implementação. Principalmente, devido à necessidade de base florestal. Conforme explica, a madeira da região fornece matéria-prima para fábricas de celulose e indústrias do ramo moveleiro.
Maiores áreas plantadas nas Regiões Sul, Centro-Sul, Campanha e Fronteira Oeste
Eucalipto, pinus e acácia negra
- Piratini (40.157 hectares)
- Butiá (18.422 hectares)
- São José do Norte (18.414 hectares)
- Canguçu (16.352 hectares)
Fonte: Ageflor, 2023
Produtores florestais buscam mudanças legislativas para ampliar áreas de plantio
Apesar dos avanços em projetos que podem alavancar a silvicultura gaúcha, Chies chama atenção para a estagnação das áreas florestais plantadas no Rio Grande do Sul. Segundo ele, após um crescimento intenso no princípio dos anos 2000, o Estado não foi capaz de alavancar o setor na mesma proporção que outros entes federativos. A problemática, explica, estaria relacionada a entraves na legislação, que começaram a ser alterados recentemente.
No nível federal, a mudança chegou em junho de 2024, quando foi sancionada a Lei 14.876. Aprovada no mês anterior pelo Congresso Nacional, a normativa exclui a silvicultura da lista de práticas poluidoras e prejudiciais ao meio ambiente e torna-se isenta da Taxa de Controle e Fiscalização Ambiental, devida ao Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama).
A legislação, no entanto, ainda não foi capaz de suscitar um efeito prático na produção gaúcha, avalia Chies. “Foi feita essa correção e, a nível federal, trouxe uma segurança jurídica de que a atividade é de baixo potencial poluidor e, portanto, deve ser tratada dessa maneira pelas normativas que a regem. Mas até isso refletir no nível do Rio Grande do Sul vai levar um tempo. Acho que é um desafio agora fazer esta equalização das normas federais com as estaduais”, analisa.
No nível estadual, o debate tem sido feito em torno de uma nova análise do Zoneamento Ambiental para a Silvicultura. Em 2023, o Conselho do Meio Ambiente (Consema) aprovou por unanimidade a revisão dos critérios de disponibilidade hídrica para aprovar novas áreas de plantio. Com isso, foi quadruplicada a quantidade permitida de hectares para plantio em cada unidade de paisagem natural por bacia hidrográfica.
Apesar da mudança, os produtores ainda esperam a avaliação de outras possíveis alterações no zoneamento pelo Consema. “Ficou ainda de se avaliar de maneira mais detalhada uma outra norma, que é a condição de tamanho e distância entre plantios florestais. Se eu tivesse um plantio florestal de grande porte, não poderia plantar outro de grande porte próximo a ele no zoneamento. Isso trazia entraves porque não são todas as regiões do Estado que são interessantes para a indústria de base florestal”, considera.
Tanto a alteração aprovada quanto a que está na pauta do Consema têm trazido intensas discussões entre os produtores florestais e o movimento ambientalista. Enquanto estes afirmam que a flexibilização das normativas do zoneamento favorece a monocultura de espécies exógenas (como o pinus e o eucalipto) em detrimento da degradação do bioma pampa, os silvicultores defendem que o plantio florestal colabora com a sustentabilidade em certos fatores, entre eles a fixação dos estoques de carbono no solo.
Informações: Jornal do Comércio.