Brasil é reconhecido pelo trabalho de manejo de árvores cultivadas para fins industriais

Embaixador José Carlos da Fonseca Júnior fala sobre a sua atuação na Empapel, associação que representa os fabricantes de papel para embalagem, e na Indústria Brasileira de Árvores (Ibá)

O embaixador José Carlos da Fonseca Júnior (foto) fez longa carreira atuando como diplomata por quase quatro décadas. Na sua trajetória diplomática, ele ocupou diversas posições, no Brasil e no exterior. Foi embaixador do Brasil em Yangon, Myanmar, e ministro conselheiro em Nova Delhi, na Índia, além de ter servido duas vezes em Washington, nos Estados Unidos, em Ottawa, no Canadá, Maputo, em Moçambique, Abu Dhabi, nos Emirados Árabes Unidos, em Santiago, no Chile, e Manila, nas Filipinas.

Na administração pública e na política, o embaixador Fonseca também foi deputado federal, representando o seu estado natal, o Espírito Santo, onde igualmente foi secretário da Fazenda e secretário chefe da Casa Civil. No Governo Federal, em Brasília, trabalhou no Departamento de Promoção Comercial e na Secretaria Geral do Itamaraty e, por duas vezes, no Ministério da Fazenda: como assessor especial do ministro Marcílio Marques Moreira (1991-1992), e como chefe de gabinete do ministro Pedro Malan (1996-1998).

No setor privado, José Carlos chegou à Indústria Brasileira de Árvores (Ibá), em abril de 2019, para ser seu diretor-executivo. Atualmente ele é diretor de Relações Institucionais da associação responsável pela representação institucional da cadeia produtiva de árvores plantadas, do campo à indústria, junto a seus principais públicos de interesse. Na qualidade de diretor da Ibá, José Carlos também teve assento no Comitê Diretor do The Forests Dialogue (TFD), além de atualmente ser o vice-presidente do International Council of Forest and Paper Associations (ICFPA). Seu trabalho sempre foi muito elogiado pela seriedade e sobretudo pelo profissionalismo.

sao paulo josé carlos da fonseca junior, presidente da empapel.
Foto: Arquivo Pessoal

Entre dezembro de 2021 e dezembro de 2023, foi co-facilitador da Coalizão Brasil Clima, Florestas e Agricultura, representando o setor privado na plataforma multissetorial com mais de 300 membros. Em setembro de 2023, tornou-se presidente-executivo da Empapel, associação que representa os fabricantes de papel para embalagem. Em julho de 2024, assumiu como presidente do Advisory Committee on Sustainable Forest-based Industry (ACSFI/FAO).

Como o senhor enxerga o papel da Empapel na transição para uma economia de baixo carbono nos próximos cinco anos, especialmente diante da pressão regulatória contra embalagens não recicláveis?

Vale contextualizar que atualmente tenho atuação direta em duas associações irmãs do setor de base florestal. Sou diretor de Relações Internacionais da Indústria Brasileira de Árvores (Ibá), associação de quase 50 associados que trabalham desde o plantio de árvores com finalidades industriais até os múltiplos usos das fibras. Também sou presidente-executivo da Empapel – Associação Brasileira de Embalagens em Papel, que é uma associação que reúne cerca de 50 associados, entre empresas fabricantes de embalagens em papel/papel para embalagens, assim como cartonagens, que convertem chapas de papel/papelão ondulado em caixas. Então, juntas, ambas as associações possuem uma atuação em toda a cadeia, desde o plantio, até o produto final. As embalagens de papel, especificamente, vêm em um permanente avanço. Em 2024, a produção de papelão ondulado bateu recorde histórico e o papel-cartão avançou 14%. Entre os fatores impulsionadores, como questões conjunturais, não podemos deixar de mencionar o aumento da consciência ambiental da sociedade. Com origem renovável, biodegradáveis e altamente recicláveis, elas são alternativa natural a itens de origem fóssil. Uma embalagem de papel possui 45% de carbono estocado, que foi retirado da atmosfera em forma de gás, por meio da fotossíntese das árvores. Além disso, atualmente 58% do papel no Brasil é reciclado. Importante pontuar que as companhias souberam ler o cenário e antecipar este momento, podendo assim se preparar para atender a demanda crescente dos consumidores por papelão ondulado. Desde 2019 foram R$ 17 bilhões investidos em novas fábricas e modernizações, o que permite atender ao cliente de maneira ágil e sustentável. Assim, uma das missões da Empapel é apoiar as companhias, trabalhando na divulgação dos atributos sustentáveis das embalagens de papel; aproximando ainda mais o setor dos profissionais que decidem por qual embalagem comprar dentro dos brand owners (donos de marca); e estimulando a consciência ambiental no público final.

Agora à frente do ACSFI da FAO, quais prioridades o senhor pretende levar para o debate internacional e de que maneira isso pode abrir portas para as indústrias brasileiras de base florestal?

Importante destacar que o ACSFI (Advisory Committee on Sustainable Forest-based Industry) é um colegiado que representa o setor privado mundial, no âmbito da FAO (Organização da Agricultura e da Alimentação), um órgão especializado da ONU. Sua atuação visa a contribuir com as deliberações da FAO, que são enriquecidas por discussões sobre boas práticas, oportunidades e desafios para o setor privado de base florestal nos diversos países e regiões. Nosso objetivo é mapear potenciais sinergias e também gargalos, para que possamos trabalhar juntos na promoção do setor. Outra missão que tenho é a de mostrar ao mundo as especificidades de nosso modelos de negócios, em especial os sistemas de manejo florestal que desenvolvemos ao longo de décadas, nos chamados mosaicos florestais, que intercalam árvores cultivadas com florestas nativas preservadas. O Brasil, vale mencionar, é benchmark (ponto de referência) global no manejo sustentável de árvores cultivadas. Para cada hectare cultivado para fim industrial, outro 0,7 é conservado. Ou seja, colhemos e replantamos em mais de 10 milhões de hectares, enquanto preservamos praticamente 7 milhões de hectares. Além disso, por meio de muita ciência aplicada, conseguimos tornar nossas árvores mais produtivas. Enquanto o ciclo para colheita do eucalipto em outras regiões pode chegar até a 14 anos, aqui no país fica em torno de 6 ou 7 anos. Além disso, estamos fazendo mais com menos. Para se ter uma ideia do avanço, o eucalipto, na década de 1970, tinha produtividade média na casa dos 10 m³/ha/ano e, atualmente alcança 33,7 m³/ha/ano. Desse modo, um dos objetivos é também consolidar a posição de protagonismo do setor de base florestal brasileiro, atualmente já reconhecido, destacando igualmente os atributos socioambientais de nossas atividades, assim como o impacto positivo que o setor tem na vida das pessoas.

sao paulo josé carlos da fonseca junior, presidente da empapel.
Foto: Arquivo Pessoal

A Ibá projeta investimentos na ordem de R$ 105 bilhões no setor florestal até 2028. Quais tecnologias considera mais transformadoras para garantir retorno sobre esse volume de capital?

Estes são verdadeiros bioinvestimentos, direcionados para implantação de florestas, novas plantas industriais e modernização de unidades já existentes, além de P&D e logística. É um setor muito sólido, cujos investimentos são realizados de maneira perene, em ciclos longos e com muita segurança. Por exemplo, mesmo no período de forte recessão, entre 2016 e 2019, o setor teve investimentos de R$ 18 bilhões. Temos tido em média a abertura de uma nova fábrica a cada ano e meio, na contramão do processo de desindustrialização que, infelizmente, o Brasil vem atravessando. Por outro lado, esses aportes são bastante diversificados, seja do ponto de vista geográfico ou de segmento dentro de nossa indústria. Os dois maiores e mais recentes investimentos são no Mato Grosso do Sul, com Suzano e Arauco investindo em novas unidades fabris para produção de celulose. Vale um olhar especial para o estado que se mostra como a nova fronteira da celulose. O setor está transformando a realidade agroindustrial do MS, especialmente na chamada costa leste, tornando produtivas terras antes degradadas por outras culturas, levando emprego e renda. Há investimentos igualmente importantes no Rio Grande do Sul, por parte da CMPC, na modernização de sua planta que também produz celulose, para torná-la ainda mais sustentável. Em Santa Catarina, a Irani, que produz papelão ondulado e caixas, avança com seu Projeto Gaia, também de olho na modernização sustentável de suas operações. A Klabin, recentemente, inaugurou uma nova fábrica modelo em Piracicaba (SP) também para fabricação de papelão ondulado. No quesito embalagens, a Melhoramentos investiu em Camanducaia (MG), em um novo projeto para produção de embalagens de papel sustentáveis para acondicionar alimentos e com capacidade de ir direto para microondas ou freezer. Já no estado de São Paulo, em Lençóis Paulista, a Bracell fez aporte de olho na produção de papéis para higiene pessoal, mais um mercado em forte crescimento no país.
Também vale dizer que a Unilin está colocando recursos em uma nova fábrica para produção de pisos laminados no Paraná. Enfim, esse rápido panorama não exaustivo de alguns dos investimentos do setor comprova o comprometimento com a sustentabilidade e com o consumidor.

Diante do crescimento expressivo das startups de restauração florestal, como a Ibá e a Empapel pretendem colaborar com esse ecossistema de inovação para acelerar restauração, gerar empregos e qualificar créditos de carbono?

O core business do setor de base florestal é plantar árvores. Com investimento e muita capacitação profissional, nós nos tornamos uma referência em todas as etapas logísticas para cultivo – seleção de clones, melhoramento genético, viveiros, monitoramento e colheira. A Ibá está completando 11 anos em 2025 e todo esse conhecimento pulsa dentro da associação por meio das companhias que são associadas. Isso acabou atraindo a atenção de outras atividades como a silvicultura de espécies nativas. Hoje é possível tornar a restauração um modelo de negócio de diferentes frentes de monetização como mercado de carbono, pagamento por serviços ambientais, manejo para produção de madeiras, entre outros. Atualmente há empresas como a Symbiosis, que há anos desenvolveu seu business sustentado pelo replantio de espécies da Mata Atlântica no Sul da Bahia, com finalidade de produzir madeira de alta qualidade certificada e com rastreabilidade, além de crédito de carbono. Já outras empresas, como Biomas, Re.green, Mombak e Carbon2Nature, foram ao mercado captar e estão se estruturando como players no mercado de crédito de carbono ou serviços ambientais. Esta é uma demanda que tende a crescer e as companhias têm buscado a expertise que existe dentro da Ibá para aplicarem a seus negócios.

Entre as novas aplicações da celulose, como os biocompósitos e a celulose microfibrilada, quais despertam mais interesse do senhor e onde o Brasil pode ter uma posição de destaque?

Consideramos a árvore cultivada para fins industriais uma verdadeira biorrefinaria. Dali são produzidos mais de 5.000 bioprodutos. Nos últimos anos, devido a investimentos de longo prazo em P&D e inovação, os novos usos da madeira, da lignina e das fibras vegetais estão possibilitando vislumbrarmos itens ainda mais sustentáveis. A celulose solúvel já é matéria-prima alternativa às de fonte fóssil em diversos produtos, como pneus de alta performance, armações de óculos de acetato, tintas, entre outros. Destaque especial para as roupas: a viscose, produzida à base de celulose solúvel, já é responsável por mais de 7% da fabricação de tecidos no mundo. Já pelo lado da nanocelulose, temos um enorme campo para avançar. A celulose microfibrilada será responsável pela produção de fios têxteis com a utilização de menos água e menos químicos, em até 90%. A nanocelulose também possibilitará a substituição de camadas de plástico e alumínio em caixas de leite ou de suco, tornando-as ainda mais recicláveis e biodegradáveis. Enfim, há uma enorme avenida de possibilidades sustentáveis a partir da celulose.

Críticas ao setor florestal costumam apontar competição por terra e uso de água. Como o setor pode demonstrar, com dados concretos, que há espaço para produção responsável?

Como comentei, o Brasil é globalmente reconhecido pelo trabalho pioneiro, moderno e sustentável no manejo de árvores cultivadas para fins industriais. Trata-se de um setor que tem como premissa usar a terra de maneira inteligente, respeitar a natureza e cuidar das pessoas. Alguns mitos do passado vêm sendo desmentidos pela ciência. Se o cultivo de eucalipto e pinus fosse danoso para o solo ou o meio ambiente, teríamos que ser uma atividade nômade, o que não se confirma pela realidade de plantios estabelecidos há décadas nas mesmas áreas. O setor de árvores plantadas está em uma área de 10 milhões de hectares, muito menor do que os 88 milhões de hectares de terras degradadas no país (segundo a Universidade Federal de Goiás) ou dos 164 milhões de hectares destinados para a agropecuária no Brasil. Plantamos 1,8 milhão de árvores todos os dias no Brasil. Não há nada mais efetivo para sequestrar CO2 da atmosfera do que a fotossíntese vegetal. Portanto, partimos de uma contribuição muito significativa no combate às mudanças climáticas. Como mencionei, conservamos outros 6,9 milhões de hectares de mata nativa. O manejo em mosaico favorece a biodiversidade, que encontra nos corredores ecológicos local para abrigo, passagem em segurança, procriação ou alimentação. Fato é que no último levantamento da Ibá, as companhias identificaram em suas áreas mais de 3.000 espécies de fauna e flora. Até mesmo animais que estavam ameaçados de extinção encontraram nestes locais uma zona de segurança. Vale destacar que as áreas de plantio e de conservação, juntas, possuem um estoque médio de CO2 na ordem de 4,2 bilhões de toneladas. Além disso, estudo da Embrapa já comprovou que a substituição de outras práticas agrícolas, como pecuária por silvicultura, aumenta o estoque de carbono no solo. Também é possível indicar o compromisso do setor no monitoramento de mais de 50 microbacias espalhadas pelos locais de plantios. Por fim, não posso deixar de mencionar o importante papel social do setor, que gera mais de 2 milhões de oportunidades pelo Brasil, especialmente em locais distantes dos grandes centros e economicamente antes deprimidas.

Que competências serão essenciais nos próximos anos para os quadros técnicos e executivos do setor florestal? Como as entidades que o senhor lidera contribuem para essa formação?

Por tudo que foi comentado, o setor de base florestal demonstra enorme dinamismo e tem horizonte de crescimento. Como se trata de uma agroindústria, as oportunidades que se abrem são de diferentes níveis, tanto para trabalho no campo quanto em plantas fabris, em logística, comércio exterior e etc. Assim serão necessários profissionais para trabalhar em viveiros, com melhoramento genético, em maquinários altamente tecnológicos utilizados em plantio ou para colheita, assim como na indústria, que se mostra cada vez mais moderna e já começa a inserir Inteligência Artificial em seus processos. O papel das associações nesse contexto é apoiar as companhias do setor no diálogo com o governo e instituições capazes de criar soluções para formação de mão de obra qualificada para atender as necessidades atuais e futuras.

Que recado o senhor deixaria para os jovens empreendedores que veem nas florestas plantadas e nas embalagens de papel uma nova fronteira de inovação?

Se tem um setor que é contemporâneo de seu tempo e, ao mesmo tempo, está com os dois pés fincados no futuro, é o setor de base florestal. Os debates sobre sustentabilidade que hoje emergem na sociedade fazem parte do dia a dia das empresas de árvores cultivadas há anos. Este contexto, aliado aos expressivos investimentos anunciados e já em curso, evidencia seu potencial. Volto a utilizar o Mato Grosso do Sul como exemplo. Na região, estão sendo abertas vagas de empregos de diversos níveis. Junto a isso, a chegada de grandes companhias a locais economicamente deprimidos fomenta todos os setores de comércio e serviços do local. Apesar de ser um estado grande, a população não é numerosa. Desse modo, há diversas vagas de trabalho a serem preenchidas, num processo de atração ditado pelas novas oportunidades. Com este avanço da atividade, também há necessidade cada vez maior de mão de obra especializada e qualificada. Portanto, para os jovens que buscam trabalhar em um setor que está do lado certo da equação climática, sólido e com olhar no futuro, certamente a indústria de base florestal é o local certo.

Informações: Jornal de Brasília.

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